O assessor econômico do Sisejufe, Washington Lima, acaba de publicar em seu blog, www.economiaetrabalho.com.br um estudo que mostra as perdas dos trabalhadores devido à falta de correção da tabela do Imposto de Renda. A pesquisa, realizada em 2013 e 2014, foi atualizada para 2015 com novos dados e elementos.
Através de cálculos demonstrados em tabelas, Washington exemplifica quanto os trabalhadores estão pagando a mais devido ao fato de a tabela ter ficado congelada durante vários anos no governo Fernando Henrique Cardoso, e, mesmo nos governos de Luis Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, embora anualmente tenha havido correção nos valores, mas não no mesmo percentual da inflação.
O estudo aponta que, se houvesse a correção da tabela, só começaria a pagar imposto de renda o trabalhador com base anual de cálculo do IR a partir de R$41.372,81. Na atual começa-se a pagar IR quem tem uma base de cálculo anual superior a R$21.453,24, praticamente a metade da base de cálculo caso houvesse correção da inflação na tabela corrigida pela inflação. Veja abaixo o artigo na íntegra:
Por Washington Lima*
Já faz muito tempo, sabe-se que há um grande problema na carga tributária do país, principalmente com relação ao Imposto de Renda – IR.
O Brasil tem uma carga tributária das mais desiguais do planeta. Pois são os setores mais pobres da população, principalmente os trabalhadores [1], que em proporção a sua renda pagam mais impostos.
Assim a carga tributária ao invés de ser progressiva – onde os que têm a maior renda pagam, proporcionalmente, mais impostos, os impostos são regressivos, ou seja, quem ganha menos paga mais impostos, em relação a sua renda.
Inúmeros Estudos comprovam essa situação, inclusive da própria Receita Federal.
Um dos aspectos mais perversos dessa política tributária é o Imposto de Renda. Durante o governo do tucano Fernando Henrique Cardoso – FHC, a tabela do imposto de renda, tanto do ajuste anual, como do retido na fonte, ficou congelada de 1997 a 2001.
Só para ilustrar, imagine a situação de por muitos anos não haver correção dos salários frente à inflação, que no período, inclusive, foi muito expressiva.
Os servidores sabem muito bem o que isso representa, pois também nessa época ficaram com suas remunerações congeladas.
Obviamente que dessa forma, cai o poder de compra, do assalariado a cada ano.
Com a tabela do IR congelada ocorre a mesma situação. Se há uma inflação, a tabela tem de ser corrigida, pelo menos no mesmo percentual, pois se isso não ocorrer, o trabalhador termina por aumentar PERCENTUALMENTE seus gastos com o IR, já que houve um aumento no salário, aumentando sua tributação, em proporção maior do que a elevação da remuneração.
Na prática é como se a reposição salarial, não ocorresse totalmente, pois uma parte dela irá para pagamento do IR que será maior PERCENTUALMENTE a cada ano em que tabela estiver congelada.
Se isso é verdade de um ano para outro, imagine durante anos.
Abaixo, temos a Tabela de AJUSTE ANUAL que ficou congelada em 1997, 1998, 1999, 2000 e 2001, durante o governo FHC.
A Tabela do IR Retido na Fonte – IRRF, também ficou inalterada durante todo esse período.
TABELA DE IR AJUSTE ANUAL EM VIGOR DE 1997 A 2001
Base de cálculo anual em R$ | Alíquota % | Parcela a deduzir do imposto em R$ |
Até 10.800,00 | – | Isento |
De 10.800,00 até 21.600,00 | 15 | 1.620,00 |
TABELA DE AJUSTE ANUAL DE 1997 SE AUTALIZADA PELO IGP-M
Se a mesma tabela fosse corrigida pela inflação, medida pelo Índice Geral de Preços ao Consumidor a Preços do Mercado – IGP – M, desde janeiro de 1998 até dezembro de 2014 ela ficaria assim:
Base de cálculo anual em R$ | Alíquota % | Parcela a deduzir do imposto em R$ |
Até 41.372,81 | – | Isento |
De 41.372,81 até 82.745,63 | 15 | 5.985,95 |
Acima de 82.745,63 | 25 | 13.967,21 |
A tabela abaixo, que é a atualmente em vigor, teve correções, durante os governos de Lula e Dilma, porém mesmo nesses dois governos, um pouco abaixo da inflação e o principal, não foi corrigida a grave distorção que ocorreu durante a era FHC:
TABELA DE AJUSTE ANUAL ATUALMENTE EM VIGOR
Base de cálculo anual em R$ | Alíquota % | Parcela a deduzir do imposto em R$ |
Até 21.453,24 | – | |
De 21.453,25 até 32.151,48 | 7,50% | 1.608,99 |
De 32.151,49 até 42.869,16 | 15% | 4.020,35 |
De 42.869,17 até 53.565,72 | 22,50% | 7.235,54 |
Acima de 53.565,72 | 27,50% | 9.913,83 |
Note as diferenças entre ambas.
Se houvesse a correção da tabela, só começaria a pagar imposto de renda, o trabalhador com base anual de cálculo do IR a partir de R$41.372,81.
Na atual começa-se a pagar IR quem tem uma base de cálculo anual superior a R$21.453,24, praticamente a metade da base de cálculo caso houvesse correção da inflação na tabela corrigida pela inflação.
Além das situações que podem ser vistas na calculadora, a seguir há alguns exemplos no sentido de deixar o mais claro possível à situação.
Assim tomando como exemplo um assalariado com renda mensal de R$ 4.000,00.
Para facilitar o raciocínio, adota-se como hipótese também que mensalmente esse assalariado pague 11% a Previdência, e que no ajuste anual, consiga descontar mais 15% de sua renda com educação, saúde, e outros descontos autorizados.
Nos outros exemplos, nas tabelas e gráficos, também foi utilizado o mesmo critério, sendo que no caso do desconto previdenciário limitado ao teto.
A base de cálculo do mesmo para o ajuste anual seria de R$36.312,00 e pela atual tabela ele vai pagar R$1.426,45 na declaração de ajuste anual.
Porém se a tabela fosse modificada conforme a inflação a partir de janeiro de 1998, não haveria nada a ser pago, pois sua base de cálculo seria inferior ao necessário para se começar a pagar o IR.
E, claro, se houve pagamentos do Imposto de Renda Retido na Fonte – IRRF, durante o ano de 2014, haveria restituição do total contribuído.
Obviamente que em se atualizando a tabela do IR do Ajuste Anual, também deverá ser atualizada a tabela do IR Retido na Fonte.
Observe-se que está sendo tributado com Imposto sobre a RENDA, um trabalhador que tem SALÁRIO, pouco acima do salário mínimo necessário do DIEESE – Departamento Intersindical de Estatística e Estudo Sócio- Econômicos, que em dezembro de 2014 era de R$2.975,55.
EXEMPLO ASSALARIADO COM RENDA MENSAL BRUTA DE R$ 4.000,00
Renda Mensal Bruta | 4.000,00 |
Renda Mensal Bruta Sem Previdência | 3.560,00 |
Renda Anual Bruta Sem Previdência | 42.720,00 |
Outros Descontos 15% | 6.408,00 |
Base de Cálculo | 36.312,00 |
IR a Pagar Tabela Atual | 1.426,45 |
IR a Pagar Tabela Corrigida | 0 |
Valor Pago a Maior | 1.426,45 |
Vamos supor, agora, um trabalhador com renda mensal de R$ 5.000,00 e com os mesmos critérios acima para as projeções. Apenas limitando o desconto previdenciário mensal ao teto de contribuição
EXEMPLO ASSALARIADO COM RENDA MENSAL BRUTA DE R$ 5.000,00
Renda Mensal Bruta | 5.000,00 |
Renda Mensal Bruta Sem PSSS | 4.517,07 |
Renda Anual Bruta Sem PSSS | 54.204,88 |
Outros Descontos 15% | 8.130,73 |
Base de Cálculo | 46.074,15 |
IR a Pagar Tabela Atual | 3.131,14 |
IR a Pagar Tabela Corrigida | 705,20 |
Valor Pago a Maior | 2.425,94 |
Diferença em % | 344,01% |
Ele vai pagar, por ano, R$3.131,14, quando deveria pagar R$705,20. Assim, está pagando A MAIS, R$2.425,94, ou acréscimo de 344,01%.
Sempre lembrando que se durante o ano de 2014 houve IR retido na fonte, na declaração de ajuste anual, nesse e em outros casos, haveria restituição do imposto pago a maior.
Também para simplificar, nos dois casos anteriores, na calculadora, e nas outras hipóteses de remuneração, não está sendo considerado o IR sobre o 13º. Salário.
Caso fosse calculado também o que está sendo pago a mais, a diferença seria ainda maior.
No gráfico abaixo, vemos que conforme a renda mensal, o quanto monetariamente está sendo pago a mais pela não atualização da tabela do IR.
Já foi visto acima os exemplos dos salários mensais de R$ 4.000,00 que está sendo pago a maior, R$1.426,45, e de R$5.000,00 com diferença a maior de R$2.425,94.
GRÁFICO DA DIFERENÇA DE IR A MAIOR POR FAIXA SALARIAL
Um salário mensal de R$6.000,00, paga R$3.190,94 a mais, outro de R$10.000,00 a diferença é de R$6.993,51, e, assim sucessivamente.
No gráfico a seguir, mostra-se o percentual da diferença entre o que está sendo pago a mais.
No exemplo acima de remuneração de R$4.000, como não haveria nada a ser pago se a tabela de IR fosse corrigida, não há como demonstrar graficamente.
Porém com um salário mensal de R$5.000,00 o valor pago a mais de IR é de 344,01%, de R$ 6.000,00 a maior 142,76%, e, de R$7.000,00 diferença de 122,21%, e, assim sucessivamente.
GRÁFICO DA DIFERENÇA DE IR A MAIOR POR FAIXA SALARIAL EM PERCENTUAL
O ponto importante nesse gráfico, é que quanto maior a remuneração mensal, MENOR a diferença entre as tabelas.
A maior renda mensal exemplificada, a de R$40.000, a diferença entre as tabelas é de apenas 16,97%.
Assim, pode-se notar claramente, que a não correção da tabela, afeta principalmente os trabalhadores de menor renda.
Muito embora, as perdas ocorram em todas as faixas salariais.
Como se vê o congelamento da tabela no período de 1997 a 2001, e até hoje não corrigida, prejudica violentamente os menores salários.
Vale repetir, que independente do quanto se ganha, haverá sempre uma diferença entre as tabelas, inclusive para as maiores rendas.
Porém os mais prejudicados, estão sempre entre aqueles com as remunerações menores, que por “coincidência” onde está concentrado grande parte dos assalariados do país.
É fundamentalmente com essa política que elevou a arrecadação com o IR, a níveis nunca vistos antes.
Em valores correntes, ou seja, sem considerar a inflação, no ano de 1997, arrecadou-se que com o IR um total de R$35,572 bilhões, e, em 2014 de R$304,519 bilhões.
Assim houve uma elevação no recolhimento de IR de R$268,947 bilhões, ou impressionantes 756,06%.
TABELA COMPARATIVA ARRECADAÇÃO COM IR DE 1997 E 2014
EM MOEDA CORRENTE | VALORES ARRECADADOS | AUMENTOS 2014/1997 | ||
Ítem | 1997 | 2014 | em R$ | Em % |
IR TOTAL | 35,572 | 304,519 | 268,947 | 756,06% |
IR PESSOA FÍSICA | 2,644 | 27,805 | 25,161 | 951,63% |
IR PESSOA JURÍDICA | 12,222 | 121,257 | 109,035 | 892,12% |
IR RETIDO NA FONTE | 20,706 | 155,457 | 134,751 | 650,78% |
Valores em R$ Bilhões |
A inflação medida pelo Índice Geral de Preços do Mercado, IGP-M, de janeiro de 1998 a dezembro de 2014 foi de 283,08%.
E, como visto acima, o aumento da arrecadação do IR Total foi de 756,06%, da Pessoa Física de 951,63%, da Pessoa Jurídica de 892,12%, e do Retido na Fonte de 650,78%.
Percentuais de aumento, em todos os casos, muito acima da inflação. Ressalte-se o aumento na Pessoa Física, maior do que o da Pessoa Jurídica.
Evidentemente que para uma maior justiça tributária a relação deveria ser inversa.
A Tabela abaixo traz os mesmos valores arrecadados, só que agora atualizados pelo IGP-M, até dezembro de 2014.
Assim atualizando os valores arrecadados em 1997 pela inflação, a partir de janeiro de 1998, houve um aumento real, de R$168,249 bilhões, ou 123,47% além da inflação.
TABELA COMPARATIVA ARRECADAÇÃO COM IR DE 1997 E 2014 – Valores atualizados pelo IGP-M
CORRIGIDO IGP-M | VALORES ARRECADADOS | AUMENTOS 2014/1997 | ||
Ítem | 1997 | 2014 | em R$ | Em % |
IR TOTAL | 136,270 | 304,519 | 168,249 | 123,47% |
IR PESSOA FÍSICA | 10,129 | 27,805 | 17,676 | 174,52% |
IR PESSOA JURÍDICA | 46,820 | 121,257 | 74,437 | 158,98% |
IR RETIDO NA FONTE | 79,321 | 155,457 | 76,136 | 95,98% |
Valores em R$ Bilhões |
Observe que o valor arrecadado, descontando a inflação mais do que dobrou no período.
Claro está que existem outros fatores para o aumento da arrecadação com o IR, como o crescimento do país, e, a melhoria na fiscalização.
Mas de qualquer forma, o principal e decisivo mote para essa brutal elevação, é a falta de correção da distorção gerada com o congelamento da tabela durante o governo FHC.
Uma prova decisiva nesse sentido é a comparação da arrecadação com o PIB – Produto Interno Bruto.
Em 1997, o IR Total representava 3,788% do PIB. E, em 2014 passou para 5,517%.
TABELA ARRECADAÇÃO DO IR E PIB
PIB | 1997 | 2014 | Aumento % |
IR TOTAL | 3,788% | 5,517% | 45,65% |
IR PESSOA FÍSICA | 0,282% | 0,504% | 78,92% |
IR PESSOA JURÍDICA | 1,301% | 2,197% | 68,79% |
IR RETIDO NA FONTE | 2,205% | 2,816% | 27,73% |
Ou seja, proporcionalmente houve um aumento de 45,65% para ALÉM do crescimento considerável do PIB no período.
Se essa elevação ocorresse em função de uma alíquota mais progressiva, onde os mais ricos pagam para diminuir os percentuais para os trabalhadores de menor renda, não haveria problema.
Mas o que vê como já colocado, é que está acontecendo o contrário.
Além dos trabalhadores com menores rendas arcarem com uma parte cada vez maior de seus salários para pagar o IR, os grandes empresários são os maiores beneficiados desse quadro, pois são premiados com inúmeras isenções, empréstimos super-subsídiados do governo, desonerações fiscais de toda ordem, reduzindo em muito a proporção de imposto realmente pago.
São centenas de bilhões de reais doados para poucos, em detrimento da maioria da população.
Que paga mais imposto, e na contrapartida não vê o estado investindo na mesma proporção na melhoria dos serviços públicos, como os de saúde, educação, segurança, etc..
Da mesma forma os bancos e os especuladores, também são os grandes beneficiados, pois os superávits fiscais gerados pelo aumento de arrecadação com o IR, obtido pelo governo são utilizados para o pagamento da dívida com os mesmos.
Dívida, como se sabe, que tem as taxas de juros dentre as mais altas do mundo, e que continua aumentando.
Essa distorção na tabela do IR, na PRÁTICA faz acontecer a Reforma Tributária. Só que não para corrigir as distorções existentes.
Mas sim para aumenta-las, pois os grandes empresários estão tendo suas reivindicações atendidas, e os assalariados, e setores médios da população, estão pagando mais imposto, do que deveriam.
Por isso, para se falar seriamente sobre modificar a tributação no país, certamente o passo muito importante, seria a necessária e urgente correção pela inflação desde 1997 da tabela do Imposto de Renda.
Claro que, isso não precisa ocorrer de uma única vez. Poderia se ter um plano para que num determinado tempo essa absurda distorção fosse reparada.
Mas passos concretos nesse sentido precisam ser dados urgentemente.
[1] Uma observação prévia é quando no texto faço referência aos trabalhadores, também, em geral falo dos setores médios da população, como profissionais liberais, micro, pequenos e dependendo do caso até de médios empresários, que podem ter problemas iguais ou semelhantes aos dos trabalhadores, quando se trata de IR. Prefiro não colocar diretamente no texto, pois havendo diferenças entre as situações, poderia gerar distorções na análise realizada. Essas distinções entre os casos deverão ser mais bem detalhadas em outro(s) Estudo(s).