Por Henri Figueiredo*
Estudo feito por cientistas da USP, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), com base em dados oficiais do Ministério da Saúde, mostra que, no ritmo atual, o Brasil só conseguirá imunizar 90% de sua população de 160 milhões de adultos no primeiro trimestre de 2022. Em fins de julho, 70 milhões de pessoas ainda não tinham recebido nem sequer uma dose de vacina (44% do público alvo) e para elas precisam ser reservadas 140 milhões de doses. Outras 56 milhões (35% do total) já tinham recebido a primeira dose e aguardavam a segunda aplicação. Apenas 34 milhões (ou 21%) estão completamente imunizados, ao fim do primeiro mês do segundo semestre de 2021.
De acordo com o médico infectologista Alberto Lemos, pesquisador do Laboratório de Pesquisa em Imunização e Vigilância e Saúde da Fiocruz, a variante Delta do coronavírus, inicialmente identificada na Índia, é um risco iminente. “Para a gente conseguir bloquear a circulação do vírus, é preciso de uma boa porcentagem da população vacinada. Esse número é inversamente proporcional à taxa, à velocidade de reprodução do vírus. A questão é que parece que a variante Delta tem essa taxa de reprodução um pouco maior – o que implicaria numa porcentagem de vacinação também um pouco maior”, explica Lemos.
Com cerca de 67 milhões de brasileiros acima de 18 anos sem nenhuma dose de vacina contra a covid-19 até 26 de julho e outros 57,2 milhões aguardando a segunda dose, um eventual avanço da variante Delta do coronavírus no Brasil é objeto de preocupação para autoridades e especialistas.
O Boletim Observatório Covid-19 Fiocruz, publicado em 22 de julho, apontava para uma nova fase da pandemia no país. A proporção de internações entre idosos, que esteve em 27,2% na semana epidemiológica (SE) 23 (6 a 12 de junho), depois (SE 27, de 3 a 10 de julho) foi de 31,8%. Ainda na SE 23 foi registrada a menor porcentagem de idosos no número de óbitos (44,8%). Em 22 de julho, o percentual alcançava 58,2%. A maior parte dos óbitos por covid-19 se concentra na faixa etária acima de 60 anos desde a SE 26 compreendida entre 27 de junho e 3 de julho. Os dados mostram também redução de internações em leitos de terapia intensiva na faixa etária de 50 a 59 anos e uma interrupção no aumento na faixa de 40 a 49 anos.
É justamente a velocidade da vacinação que controla a pandemia. “O ideal nesse momento é acelerar por faixa etária. Dentro das próprias faixas etárias têm as pessoas com comorbidades. A pessoa, então, só precisa mostrar um documento comprovando a idade, não precisa ir ao serviço de saúde solicitar. O vírus está na nossa frente, precisamos acelerar essa corrida. Nós estamos perdendo e cada dose conta”, disse à CNN a epidemiologista e professora da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Ethel Maciel.
Ranking do Brasil na vacinação
Em fins de julho, o Brasil estava em 66º no ranking global de vacinação na relação a cada 100 habitantes e era o 4º no total de doses. O país, que iniciou a vacinação há mais de cinco meses, já esteve na 56ª posição desse ranking e chegou a descer para a 70º. Entre os países que compõem o G20, grupo das 20 maiores economias do mundo, o país está em 11º. Segundo os dados atualizados pela Agência CNN, o Brasil aparece com 61,41 doses aplicadas a cada 100 habitantes.
O Canadá ultrapassou o Reino Unido e está na liderança da lista, com 123,96 doses na relação a cada 100 pessoas. O Reino Unido tem 122,30. Em seguida, está a Itália (105,65), a Alemanha (105,60) aparece em quarto lugar, seguido pela China (104,74). Os Estados Unidos aparecem em sexto lugar, com 101,59.
A mais recente pesquisa do Instituto DataSenado revela que a maior parte dos brasileiros – entre os que consideram que houve atraso na compra de vacinas – atribui a culpa da demora ao presidente Jair Bolsonaro – 74% dos brasileiros que consideram que houve atraso na aquisição dos imunizantes enxergam o presidente como principal responsável.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) informou que a variante Delta, com seu alto poder de transmissão, deve se tornar dominante em todo o mundo. Daí a necessidade urgente da aceleração da vacinação nas faixas etárias ainda não atingidas e da segunda dose em quem já foi vacinado.
Doenças respiratórias, neurológicas e distúrbios psiquiátricos
O médico infectologista Alberto Lemos considera que, por enquanto, é imensurável o volume de pessoas que desenvolverão sequelas após o contágio pela covid-19. Mas já é possível dizer que nunca houve nada igual, não há comparativo histórico que se possa fazer. “Em um ano e meio de pandemia, verifica-se, principalmente, problemas respiratórios, neurológicos e psiquiátricos crônicos – o que torna necessário um tratamento permanente desses pacientes”, lista Lemos.
As equipes de saúde também tendem a ficar mais expostas. “Acho, inclusive, que é um fenômeno normal o relaxamento das equipes de saúde nos aspectos de segurança e proteção contra o contágio. Trabalho há um ano e meio na pandemia e vejo pacientes com covid-19 pelo menos duas vezes por semana e não fui contagiado. Então eu mesmo já me peguei, algumas vezes, não prestando atenção em todos os procedimentos de segurança que se deve ter. Por outro lado, a gente também acumula conhecimento”, diz Lemos.
Os frequentes “apagões” no calendário de vacinação, em várias cidades do país, é outro fator preocupante. Conforme o pesquisador da Fiocruz, é muito difícil, de fato, fazer uma programação de vacinação num país tão grande e populoso como o Brasil, contudo, já se passou muito tempo. “Já teria sido possível que esse planejamento, que a logística de distribuição e aplicação de vacinas fosse mais completa. É mais compreensível um racionamento no início da distribuição das vacinas, do que no meio da vacinação, como estamos vendo acontecer. Então há uma falha no planejamento. Uma outra explicação para isso seria a falta de produção de vacina – e eu não tenho notícia, até o momento, de que seja isso o que esteja acontecendo”, completa.
*Henri Figueiredo, jornalista, especial para o Sisejufe
Para saber mais:
Brasil deve mudar vacinação por causa da variante Delta?
https://noticias.r7.com/saude/brasil-deve-mudar-vacinacao-por-causa-da-variante-delta-26072021
Painel da Vacina: Brasil está em 66º no ranking global e é 4º no total de doses
https://www.cnnbrasil.com.br/saude/2021/07/23/painel-da-vacina-brasil-esta-em-66-no-ranking-global-e-e-4-no-total-de-doses
Boletim aponta nova transição no perfil demográfico da pandemia
https://agencia.fiocruz.br/boletim-aponta-nova-transicao-no-perfil-demografico-da-pandemia
Brasil ainda precisa aplicar 196 milhões de doses e pode alcançar imunidade coletiva apenas em 2022
https://www1.folha.uol.com.br/colunas/monicabergamo/2021/07/brasil-ainda-precisa-aplicar-196-milhoes-de-doses-e-pode-alcancar-imunidade-coletiva-apenas-em-2022.shtml