Por Luiz Flávio Gomes
Dizem que a previdência está gerando um buraco no orçamento público de mais ou menos R$ 200 bilhões por ano. A previdência, no mundo todo, passa frequentemente por ajustes, que são necessários (demografia, situação econômica do país, redução de déficit público etc.). O que é incompreensível é o seguinte:
1 – Por que paralelamente à reforma não são cobrados os devedores solventes e contumazes do INSS? A dívida com o INSS é de R$ 492 bilhões (dez/18). Se o 1/3 solvente pagar, temos mais de R$ 160 bilhões.
2 – O combate mais efetivo contra a corrupção poderia recuperar boa parte do “roubado” pelos corruptos. A corrupção no Brasil desvia cerca de R$ 200 bilhões por ano (mais ou menos 3% do PIB).
3 – Se acabássemos com as renúncias e isenções fiscais, que ajudam inclusive bilionários, nossa economia seria de 8% do PIB (algo perto de R$ 500 bilhões por ano), computando União, Estados e Municípios.
4 – A média mundial das renúncias e isenções fiscais é de 2% do PIB. Estamos gastando com privilegiados e bilionários pelo menos 6% do PIB acima da média (R$ 360 bilhões).
5 – Se cobrássemos a dívida pública ativa da União teríamos R$ 1 trilhão de reais. Se os solventes fossem 1/3, teríamos mais de R$ 300 bilhões.
6 – Com uma política séria de combate à sonegação arrecadaríamos R$ 500 bilhões por ano (número de 2017).
7 – A informalidade, estimulada pelo governo, desvia dos cofres públicos cerca de R$ 1 trilhão. Mais ou menos R$ 50 bilhões não são recolhidos ao INSS anualmente.
8 – O combate à evasão de divisas para paraísos fiscais arrecadaria pelo menos uns R$ 100 bilhões por ano, que são desviados da tributação. E dificilmente são repatriados.
9 – Paraísos fiscais globais disponíveis aos privilegiados, como Luxemburgo, Irlanda, Suíça e Malta. As maiores empresas do mundo (Google, Apple, Facebook, Fiat, Starbucks etc.) têm aí suas sedes fiscais. Itaú e Bradesco não pagam mais de R$ 200 milhões de impostos por essa via. Isso é justo?
10 – Não cobramos impostos sobre dividendos (lucros dos acionistas). Isso poderia render mais de R$ 100 bilhões por ano.
11 – Com a renegociação da dívida pública poderíamos economizar de 30% a 40% do que se gasta com pagamento de juros (entre R$ 120 e R$ 160 bilhões por ano, do total de R$ 400 bilhões que são pagos anualmente).
12 – Refis e perdão de dívidas tornam as empresas dependentes, como se fossem drogaditos. Há empresas com 3 ou 4 Refis – sem eles o Estado arrecadaria milhões e milhões por ano. O Refis virou planejamento tributário!
13 – Fala-se em reforma da previdência e nada se apresenta sobre a reforma tributária, que tem que corrigir o equivocado sistema regressivo vigente (quem tem menos paga mais impostos).
14 – Como tributar aqui as empresas donas do mundo (Facebook, Apple, Google etc.)? Como tributar o dinheiro eletrônico bitcoin? Em lugar disso a reforma previdenciária está propondo que servidores e trabalhadores arquem com os seus custos, privilegiando as elites do poder.
15 – Muitos municípios brasileiros agravarão seu caos ou colapso, porque cerca de 60% deles têm o dinheiro girado pela previdência como a maior receita do município.
16 – O mais chocante: 75% da economia com a reforma recairá sobre trabalhadores da iniciativa privada de renda baixa, pessoas em situação de miséria e trabalhadores rurais (Fenafisco).
17 – A reforma está seguindo fielmente são Mateus (25:29): “Porque a todo o que tem, dar-se-lhe-á, e terá em abundância; mas ao que não tem, até aquilo que tem ser-lhe-á tirado”.
18 – Precisamos da reforma, ela será certamente aprovada em parte, mas como deputado votarei CONTRA todas as injustiças, crueldades, maldades e inconstitucionalidades que ela apresenta.
19 – A justiça recomenda que todo sacrifício deve ser distribuído entre todos. Não podem somente os servidores e trabalhadores arcar com esse ônus.
20 – Todos são todos, não alguns!
Luiz Flávio Gomes é professor, jurista e deputado federal