Mercado de trabalho foi um dos temas do evento Mulher Poder e Democracia, realizado pelo Centro Cultural Justiça Federal, de 11 a 13 de março. A assessora política do Sisejufe, Vera Miranda, participou do debate. “A precarização tem um rosto feminino”, afirmou. Para a gestora social, toda flexibilização de direitos começa por elas. “Antes da Uber, já existia o Avon. Nos salões de beleza, as regras da Carteira Verde e Amarela há muito tempo são uma realidade”, exemplificou.
Mesmo em áreas precarizadas, as mulheres aparecem em desvantagem. A assessora do sindicato falou de pesquisas mostrando que tanto como motoristas de aplicativo quanto como entregadoras de comida, elas demoram mais para serem chamadas. Com o racismo estrutural no Brasil, a situação só piora em se tratando de uma mulher negra. Segundo a última pesquisa do IBGE, uma mulher branca ganha 70% a mais, em média.
E as mulheres não são as mais prejudicadas apenas pela Reforma Trabalhista, aprovada em 2017. Com o avanço do desmonte do serviço público no país e a falta de creches e escolas em tempo integral, elas ficam cada vez mais distantes do trabalho formal. “Responsáveis pelo trabalho não remunerado da reprodução e do cuidado, as mulheres são as primeiras a sofrer num cenário de recessão” analisou. No Brasil, são 11,9 milhões de pessoas desempregadas, de acordo com a última pesquisa divulgada pelo Instituto Brasileiro de Economia e Estatística. “As mulheres são a maioria. E a taxa entre as mulheres negras chega a 60%”, lamentou Vera. A situação de desigualdade gera muitos paradoxos. Chefes de família em 40,5% dos lares, mas recebendo salários 20% menores que os homens, elas não conseguem se organizar politicamente, pois estão na busca pela sobrevivência.
No funcionalismo, elas são 51% da força de trabalho. No entanto, estão longe dos principais postos de chefia. “Nós mulheres estamos sempre provando que somos mais e melhores do que deveríamos ser”, afirmou a assessora em relação à desigualdade nos espaços de poder no mundo laboral.” E com o desmonte do setor público, a escassez de concursos e o avanço da terceirização, as mulheres voltarão a ser preteridas. “Uma mulher que sai para levar o filho no médico merece uma promoção?”, ironizou. Segundo a gestora social, ficarão ainda mais vulneráveis ao assédio moral e sexual pelo medo de perder o emprego.
Se homens e mulheres trabalham fora, seja em empresas privadas ou no serviço público ou até mesmo na informalidade, é preciso debater a jornada doméstica e os cuidados no mundo laboral. Para mudar essa realidade de sobrecarga, Vera acredita que a sociedade precisa discutir qual o impacto desse tempo de trabalho não remunerado na produtividade da atividade formal.
Participação feminina na magistratura enfrenta barreiras
A pesquisa Participação Feminina no Poder Judiciário, realizada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), divulgada no ano passado, apontou uma leve redução no percentual de magistradas, de 34,6% em 2008 para 31,2% em 2018. Na Justiça Federal, o maior contingente é de juízas federais substitutas, 37,1%, em comparação a 29,5% das juízas federais titulares. Esses dados foram apresentados pela juíza federal e diretora do Foro do Espírito Santo, Cristiane Chmatalik.
A participante da mesa afirmou que no que diz respeito às desembargadoras federais, o levantamento revela que o número atual de mulheres (20,3%) é menor do que a média da participação feminina neste nível da carreira nos últimos 10 anos (24,5%), apontando uma redução ainda mais acentuada do número de desembargadoras do que a média geral de magistradas federais.
Na segunda região, a desigualdade em relação aos homens se repete: apenas 19% são desembargadoras. O percentual de juízas titulares no Rio de Janeiro é de 41%, enquanto que no Espírito Santo esse percentual baixa para 32%. “E no Nordeste, nunca houve uma desembargadora mulher de carreira” lamentou.
O estudo é fundamental para denunciar a desigualdade de gênero no Judiciário Federal. A Comissão de Mulheres da Associação de Juízes Federais, da qual Cristiane faz parte, vem denunciando a hegemonia masculina entre os membros titulares de banca nos concursos da magistratura federal. Para a juíza, esse pode ser um elemento chave para explicar a estagnação dos números ao longo dos últimos anos. No início do mês, a partir dessa mobilização, o CNJ institui um grupo de trabalho para aumentar participação feminina em bancas de concurso da magistratura.
Não é por acaso que vítimas de violência sexual passam de vítima a ré, que os homens são os considerados “automaticamente” os chefes de família em casos de aposentadoria rural ou o grande número de indeferimentos de prisão domiciliar para grávidas e mães. Para Cristiane, mudar essa desigualdade no Poder Judiciário Federal é de absoluta importância para o processo democrático, que se fortalece na pluralidade.
Também participaram da mesa sobre Mulher e Mercado de Trabalho, a mestre em Equality Law Joana Ivo Lima e a secretária do Consulado de Angola no Brasil, Sabrina Ferreira. O debate foi mediado pela doutora em Ciência da Informação Marcia Cavalcante.
Diretora do CCJF avalia evento e aponta para processo educativo
A diretora executiva do Centro Cultural Justiça Federal, Geralda de Miranda, avaliou que esta edição consolidou o evento e acentuou a necessidade de um processo educativo para a igualdade de direitos entre homens e mulheres. Ela revelou que o objetivo é ter um grupo que desenvolva esse trabalho ao longo do ano em parceria com outras entidades, entre elas, o Sisejufe.
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