A pandemia trouxe desafios para os servidores da Justiça Eleitoral. Numa primeira etapa, eles tiveram a missão de preparar todo o processo eleitoral das eleições municipais deste ano no trabalho remoto, cumprindo as exigências do distanciamento social para evitar a disseminação da Covid-19. Mais próximo do pleito, que por causa da pandemia foi adiado para 15 de novembro, boa parte do funcionalismo passou atuar presencialmente, principalmente nas zonas eleitorais, mesmo diante do risco de contaminação. São servidoras e servidores que abriram mão da própria segurança em prol da democracia. Seja no presencial ou no remoto, em todo o país, os servidores foram essenciais para garantir, com eficiência e lisura, a votação em 5.567 municípios, nas mais de 473 mil urnas eletrônicas distribuídas em 94.326 locais de votação.
Novos métodos e estratégias
No Rio de Janeiro, servidores trabalharam incansavelmente, num esforço coletivo para viabilizar as eleições do primeiro turno e, agora, seguem empenhados nos municípios onde haverá segundo turno. Um deles é Mauro Guimarães Pinto, chefe de cartório da 204ª Zona Eleitoral, no bairro da Saúde, na capital. Ele conta que a pandemia trouxe uma situação totalmente nova, em que a experiência teve de ficar em segundo plano porque todos os processos eram novos.
“Tudo que a gente tinha de experiência sobre convocação, sobre preparação, teve que ser revisto. E sempre com aquele fantasma da pandemia. A gente teve que rever a forma de convocação de mesário, que teve de ser à distância, também foi necessário mudar a forma de requisição e vistoria de locais. Ou seja, tivemos de criar novas soluções para respeitar as regras do distanciamento. Até reuniões eram por aplicativo. Sem contar a influência que o receio de ficar doente traz para o psicológico”, desabafou.
Mauro explica que, com o trabalho remoto, os servidores ficaram mais dependentes dos sistemas operacionais e de comunicações. “Sistemas como o PJE e o de registro de candidaturas ficaram mais lentos e isso exigiu um esforço extra dos servidores”, acrescentou.
Ele aponta como ponto positivo a grande conexão que houve entre os cartórios. “A gente começou a trocar informações na busca de soluções e até mesmo orientações. A gente formou uma corrente de assistência própria… se saía um aviso todo mundo ajudava a divulgar”, disse.
“O senso de coletividade do servidor foi fundamental nessa eleição, mas a gente precisa alertar para as dificuldades enfrentadas e o sindicato tem uma função importante nisso”, completou.
Sensação de dever cumprido
Monique Lavra Garcia, chefe de cartório da 55ª Zona Eleitoral, em Maricá na Região dos Lagos, conta que o trabalho no processo de preparação das eleições municipais foi exaustivo e desafiador.
“Tivemos que nos adaptar a uma nova forma de trabalho, tanto no remoto, como no presencial. Tinha que coordenar tudo via telefone ou whatsapp. Mas até que a equipe respondeu bem, se adaptou. Eu me surpreendi com os requisitados. Alguns vieram pela primeira vez e, no meio de uma pandemia, vestiram a camisa e nos ajudaram muito, mesmo com todas as limitações que a situação nos impunha. Uma tarefa que pode parecer boba, mas que me deixou feliz em organizar foi a preparação dos kits sanitários para os mesários, pois percebi que os servidores fizeram isso com muito carinho, acho que, além do material, foi em cada saquinho os nossos desejos de que todos estivessem protegidos no dia da eleição”, conta emocionada.
Monique diz que cada etapa se apresentou como um desafio, mas o maior deles foi a captação de mesários. “Foram muitos pedidos de dispensa, até aqueles que se voluntariaram, voltaram atrás depois. O registro também foi um desafio muito grande. Outra questão que me preocupou, e ainda me preocupa, é a saúde dos servidores. Eu me sinto responsável por eles, então essa pra mim é uma preocupação constante desde que a maioria dos servidores optou por voltar ao serviço presencial”, comenta.
Apesar de tantos obstáculos a serem superados, a servidora de Maricá diz que se sentiu aliviada por ter dado tudo certo. “Sensação de dever cumprido”, afirma.
Superar adversidades
Sávio Erthal Moraes, que trabalha na 42ª Zona Eleitoral, responsável pelos municípios de Bom Jardim e Duas Barras, conta que essa foi a primeira eleição municipal nos dois municípios. Ele explica que, somadas, as duas cidades possuem uma área cinco vezes maior que Campo Grande, que é o maior Bairro do Rio de Janeiro e que são extremamente rurais. O desafio inicial foi trabalhar com quadro reduzido de servidores.
“Como até a antevéspera do dia do pleito éramos apenas dois servidores do quadro já havia um planejamento, principalmente em termos logísticos, para que pudéssemos colocar as eleições nas ruas com certa tranquilidade. Veio a questão da pandemia e todo o planejamento foi prejudicado em um primeiro momento, até que fosse feito um rearranjo de tarefas. Como ambos servidores estavam na faixa laranja do estudo do TRE-RJ, não sabíamos ao certo, até pelo ineditismo do quadro, o que poderia ocorrer, o que de certa forma nos obrigou a agir muito por instinto e experiência de pleitos anteriores”, pontua.
Sávio mora a cerca de 80 metros do cartório e pode fazer o retorno presencial mais rápido que sua colega, chefe de cartório, que mora mais distante e em outro município. Ela ficou no trabalho remoto. “Fizemos a nossa eleição “quebra-cabeça”, em que cada um fazia um pedacinho e uma vez por semana as “peças” eram juntadas e então planejávamos os próximos sete dias, assim sucessivamente, até a semana final, onde juntamos todas as peças e colocamos as eleições nas ruas”, relata.
Para o servidor, o maior desafio foi a captação, convocação, treinamento de mesários e supervisores. “Algo que no interior sempre foi acessório, se tornou, sem dúvida o principal. O espaço de tempo para a realização dessa tarefa foi, ao menos para nós, diminuída pela metade, aliada à pandemia, dúvidas sobre a nossa segurança sanitária e de nossa equipe, e a necessária substituição de ao menos 40% da força de trabalho dos mesários e supervisores nos demandou horas, dias e semanas inteiras de dedicação exclusiva. Ao final, conseguimos, de forma remota, nomear, convocar e treinar 100% das mesas e locais – sendo 90% de voluntários, com uma ausência de 1%”, revelou.
“Em todas as minhas eleições chegava em casa cansado, mas realizado. Nesta eleição, a realização veio antes mesmo da totalização. Tenho por hábito, na parte da tarde rodar todas as seções e toda vez que eu entrava, de certa forma me emocionava em ver aquelas pessoas ali, se doando com máscaras e face Shields. Eu via nos olhos deles um orgulho do que estavam fazendo. Então eu não conseguia pensar apenas em mim como servidor, meu esforço, minha dedicação. Não consigo entender a minha dedicação sem o carinho e amor do trabalho voluntário do mesário. Então, fico feliz e repito, até emocionado de ter ajudado a essas pessoas a fazer a festa de democracia, toda minha homenagem vai para eles”, disse Sávio.
Riscos da aglomeração
Victor Hugo, que é servidor da 75ª Zona Eleitoral de Campos dos Goytacazes e diretor do Sisejufe, mostra que o maior desafio foi e é, já que haverá segundo turno na cidade, realizar a festa da democracia contrariando as indicações das autoridades sanitárias. “Como toda festa, aglomerar é natural, chegar ao local de votação, rever as pessoas do nosso bairro que conhecemos há anos, aproximar, conversar muitas vezes em rodas, recordar fatos engraçados, saudosos, mostrar fotografias, e por fim se abraçar, é natural, no entanto nessa pandemia pode ser fatal”, alerta.
Ao cumprir o seu papel de servidor de garantir que os brasileiros e as brasileiras pudessem votar, ele disse: “quando o bloco tá na rua é inafastável a sensação de leveza, de pilequinho, de cumprimento, inclusive semântico do substantivo SERVIDOR. Nesse momento me sinto bem por haver sido útil à coletividade”, afirma.
Planejamento de um ano
A diretora do Sisejufe Juliana Avelar, que trabalha na sede do TRE-RJ, lembra que para fazer uma eleição é necessário quase um ano de preparação. “Para você ter uma ideia, lá em fevereiro nós, servidores concursados, estáveis, especialistas em cada área, começamos a viabilizar a estrutura por trás de uma eleição junto com os apoiadores e esse esforço coletivo, é fundamental para a realização de uma das eleições mais eficientes do mundo. Você já pensou em como a urna chega até o local de votação? Sem ela não seria possível a garantia da democracia, pois é através desse instrumento que cada um de nós, aptos a votar, podemos exercer a nossa cidadania plena. Nesse ano, a Pandemia trouxe ainda mais desafios e incertezas, fazendo desse pleito o mais complexo, pois lutamos em muitos momentos pela vida dos servidores, dos apoiadores e eleitores”, completa.
Tereza Clarice Barros Ribeiro, também diretora do sindicato e lotada na sede do Tribunal, diz que, mesmo diante de uma grave pandemia, a experiência com trabalho remoto foi muito satisfatória.
“Conseguimos fazer uma eleição quase na sua totalidade de forma remota. Eu participei do registro de candidaturas, que foi inédito porque todo treinamento foi à distância. E conseguimos provar que de casa fazemos uma eleição. Em nenhum momento paramos nosso trabalho. Os colegas das Zonas Eleitorais conseguiram, à distância, fazer treinamentos, convocações de mesários, e só comparecer ao presencial quando necessário. No dia das Eleições, havia muito temor por causa da Covid-19, muitos colegas ficaram em espaços pequenos, o que causou aglomeração, mas enfrentando aquilo ali até o final com muita fé e dedicação. A gente conseguiu fazer uma eleição satisfatória, com muito esforço dos servidores para que ela ocorresse da maneira mais segura possível para eleitores e mesários. O trabalho dá certo porque as pessoas são muito motivadas. Os colegas que foram para ponta das eleições deram o melhor de si, se arriscando, mas de forma bem satisfatória. Parabéns a eles e a todos nós”, ressaltou.
Processo exemplar
Para o diretor do Sisejufe Ricardo Loureiro, mais uma vez a nossa justiça eleitoral, como de costume, garante um processo democrático exemplar mesmo diante de uma pandemia ainda em andamento. “Sim, graças ao trabalho de todos os servidores que sempre vestem a camisa em qualquer situação… Sem esquecer daqueles que são o suporte de todo o processo – os mesários – que, na ponta, garantem o livre exercício da vontade popular”, diz o dirigente sindical.
A diretora Fernanda Lauria ressalta que o servidor da Justiça Eleitoral é extremamente guerreiro. “As circunstâncias, sempre difíceis, exigem dele essa característica. E é graças à essa força, dedicação e comprometimento que as eleições são um sucesso a cada ano. E não foi diferente dessa vez, porém, foi mais difícil, mais sofrido, mais custoso física e emocionalmente. O eleitor jamais terá ideia do tamanho do sacrifício individual e coletivo de cada servidor e cada equipe. As tantas noites em claro, as horas e horas de trabalho além da jornada, inclusive aos finais de semana e feriado, a insegurança gerada pelos riscos que envolvem o trabalho presencial atualmente e os vários casos de contaminação que surgiram nesse processo são apenas alguns exemplos desse sacrifício. E mesmo com tudo isso, um trabalho de primeira foi entregue. A revolta que ocorreu nas redes por causa do atraso de apenas duas horas e meia na apuração só mostra a qualidade desse trabalho e como seguimos sendo exemplo para o mundo, mesmo em meio a uma pandemia”, conclui Fernanda.