Nessa quarta-feira (18), o governo federal decretou que, a partir de 1º de julho deste ano, os servidores estarão submetidos a um programa de controle de desempenho a partir da “entrega de resultados” e “qualidade dos serviços prestados à sociedade”. O programa poderá ser aplicado por órgãos, autarquias e fundações da Administração. Pelo decreto, o ponto de frequência poderá ser substituído pelo acompanhamento das entregas pelas chefias imediatas que será mensurado com base em metas que deverão ser compatíveis com a jornada de trabalho regular da servidora ou servidor.
O novo programa de controle poderá ser implementado tanto para os servidores em regime de trabalho presencial quanto para aqueles que se encontrarem em teletrabalho ou trabalho remoto, mesmo que em outro país. No início do mês, o governo já havia determinado que todo o funcionalismo federal voltasse à modalidade presencial até o próximo dia 6 de junho.
As regras do Programa de Gestão e Desempenho (PGD) foram publicadas no Diário Oficial da União (DOU) e poderão ser aplicadas a servidoras e servidores efetivos, comissionados, empregados públicos em exercício na administração pública federal direta, autárquica e fundacional, contratados por tempo determinado e estagiários. Os órgãos e instituições militares ficaram de fora.
Cada órgão poderá estabelecer quais critérios definirão os resultados a serem cumpridos e que serão levados em conta como efetividade e qualidade. “A instituição do PGD será um ato discricionário da autoridade máxima do órgão ou da entidade e observará os critérios de oportunidade e conveniência”, determina o decreto.
Em relação ao teletrabalho, o decreto estabelece que a atividade remota poderá ocorrer em regime parcial ou integral e dependerá de acordo mútuo entre o servidor e a Administração, registrado “em termo de ciência e responsabilidade”.
Reforma disfarçada
O novo programa de desempenho está sendo avaliado por especialistas como a aplicação, na prática, de medidas que seriam instituídas caso a reforma administrativa do governo Bolsonaro (PEC 32) tivesse sido aprovada. “A partir de uma leitura inicial, não é difícil perceber que esse programa é mais uma etapa da chamada ‘reforma administrativa silenciosa’, que visa, entre outras coisas, a redução de despesas de pessoal e de despesas de custeio”, alerta o consultor sindical e diretor da Insight Assessoria Parlamentar, Vladimir Nepomuceno.
Para ele, a substituição do registro tradicional de frequência pelo acompanhamento dos resultados sem que seja feito um estudo aprofundado dos processos de trabalho e das demandas represadas pelo sistema é também uma justificativa que o governo encontra para não realizar os concursos públicos necessários para a reposição de servidores aposentados. “A necessária modernização da administração pública precisa ser precedida de muito debate com os servidores, suas entidades representativas e com a população usuária, além de estudiosos e especialistas em gestão pública e atendimento à população. O que, com certeza, não passa pela ideia dos atuais gestores federais”, avalia.
Economia para o governo, gastos para servidoras e servidores
O texto do decreto é claro em relação ao aumento de despesas: não poderão correr para a administração pública federal. “A opção pelo teletrabalho não poderá implicar aumento de despesa para a administração pública federal”, diz o decreto. No entanto, quem bancará toda a estrutura física e tecnológica necessária para a realização do trabalho será a servidora ou servidor, que terá que ficar disponível para contato, “em todos os meios de comunicação”, no período definido pela chefia imediata, durante o horário de funcionamento do órgão.
“Isso significa o prosseguimento da política de que o servidor em teletrabalho será o responsável pelo equipamento, condições técnicas e físicas (instalação e mobiliário adequados e ergonômicos), incluindo a responsabilidade pelo acesso à internet, plano de dados compatível com as atividades, aumento da despesas com energia elétrica, entre outras questões, para o exercício das atribuições do seu cargo efetivo, as mesmas que exerceria na instituição estando em atividade presencial”, diz Nepomuceno.
A servidora ou servidor também deverá informar e manter atualizado seu número de telefone, fixo ou móvel, que poderá ser divulgado tanto dentro do órgão ou da entidade quanto para o público externo.
Distanciamento entre usuário e serviço
Vladimir Nepomuceno alerta ainda para o fato de que a redução de despesas de custeio ser presentada, no decreto, como “consequências positivas” para “maior flexibilidade geográfica na alocação de mão de obra, redução de custos pela redução de espaço físico ocupado em imóveis pela administração pública”. O que pode significar maior dificuldade de acesso à população usuária aos serviços. “E também permitirá a dispersão dos servidores, que, por custos de moradia, poderão ser forçados a residirem em localidades mais distantes da unidade de trabalho, lembrando que, se o servidor residir em localidade distinta da sua unidade de trabalho, não haverá, segundo o decreto, custeio das despesas de deslocamento, alojamento e alimentação em caso de participação em reuniões e outras atividades para as quais seja convocado”, complementa.
Nepomuceno cita o caso do INSS como uma prova de que o decreto presidencial não atingirá os objetivos anunciados com a nova forma de controle das atividades realizadas. “Naquela autarquia, o que se vê são servidores com excesso de trabalho e sem jornada respeitada para que atinjam as metas definidas pela instituição, com o aumento drástico ade despesas e sem as mínimas condições de trabalho e com altos índices de adoecimento físico, mental e psicológico, antecipando suas aposentadorias por sobrevivência”.
Manuella Soares, jornalista, especial para o Sisejufe.