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Sindicato dos Servidores das Justiças Federais no estado do Rio de Janeiro - Telefone: (21) 2215-2443

13 de maio: abolição do quê?

Por Coletivo Enegrecer*

Será…

Que já raiou a liberdade

Ou se foi tudo ilusão

Será…

Que a Lei Áurea tão sonhada

Há tanto tempo assinada

Não foi o fim da escravidão

Hoje dentro da realidade

Onde está a liberdade

Onde está que ninguém viu…

Toda nossa luta é pela vida, todas as nossas histórias são sobrevivências. Estando nas ruas ou não, estamos lutando pelo nosso direito de estar vivos!

No dia 13 de maio de 1888 foi decretada abolição de negras e negros escravizados no Brasil. Esta que foi uma falsa abolição, já que não houve condições para que a população negra fosse inserida na nossa sociedade de forma digna. Segundo Florestan Fernandes, “Os senhores foram eximidos da responsabilidade pela manutenção e segurança dos libertos, sem que o Estado, a Igreja ou qualquer outra instituição assumisse encargos especiais, que tivessem por objeto prepará-los para o novo regime de organização da vida e do trabalho”É importante analisarmos a inexistência histórica de políticas sociais, de um estado de bem-estar social, que de fato incidiu sobre a consciência de classe dos americanos. 

Bem como a nós, negros, como o mito da democracia racial ainda nos atinge enquanto sociedade e faz com que muitos dos nossos ainda não percebam como de fato são atingidos por essa estrutura estatal racista.

Numa pandemia que atravessamos sem enxergar um palmo à frente dos nossos olhos por conta de um governo que decidiu esconder os fatos e não acreditar na ciência, vale lembrar que foram 11, sim onze propostas de compra de vacina recusadas pelo atual governo, enquanto os nossos estão tombando em decorrência da negligência e falta de habilidade do governo em lidar com essa crise sanitária, que ocasiona ainda proporções com efeitos socioeconômicos para os setores populares da sociedade brasileira, em especial o nosso povo preto que, além de ter de fazer o enfrentamento ao novo coronavírus, tem observado a redução das sua economia doméstica, o desemprego, aumento sistêmico do valor da cesta básica e uma maior vulnerabilidade na segurança alimentar.

13 de maio é uma data que serve também para relembrarmos que há muito o que lutar. É para reafirmar que a liberdade não raiou e que ainda travamos desafios cotidianos para garantir a nossa sobrevivência, principalmente a da juventude negra que é o grupo social mais exposto à violência do Estado brasileiro. Lembram dos 111 tiros desferidos pela Polícia Militar do Rio de Janeiro contra 5 jovens negros em Costa Barros (2015)? Se lembram da morte da menina Ághata no Complexo do Alemão (2019)? Da morte do menino Joel no Nordeste de Amaralina (2010)? Da Chacina do Cabula que abateu 12 pessoas negras em 2015 na periferia de Salvador? E a Chacina do Jacarezinho, que matou 25 pessoas?

O modelo de segurança pública que tem se consolidado no Brasil desde o surgimento das nossas primeiras instituições públicas, em 1808, continua a criminalizar e tornar negras e negros brasileiras/os o principal público atingido pelas mortes por homicídios e da política de encarceiramento da nossa população. Por isso, se faz tão necessário repensar a organização de um novo modelo de segurança que estruture novas bases de proteção para a população brasileira, reorientando as práticas de incursões dos órgãos que atuam na política de segurança pública e no ordenamento jurídico como forma de redimensionar a legislação brasileira, que ainda nos impõe ao papel de marginalizados, reprimindo nossa história, as nossas tradições culturais, nosso modo de vida e nossas contribuições em diversos campos da construção da identidade nacional.

Importante trazer a centralidade da ideia e considerar a imensa contribuição dos movimentos negros brasileiros na luta contra o genocídio do negro brasileiro. Abdias do Nascimento, na década de 1990, se dedicou a escrever um trabalho de enorme contribuição sobre nossa realidade racial, mas ainda antes disso os nossos ancestrais já lutavam por nossas vidas e por nossas liberdades nas senzalas. No final dos anos 1970, o Movimento Negro Unificado surge com diversas pautas, sobretudo a violência policial sobre os nossos corpos, principalmente após o assassinato do estudante Robson Luís, brutalmente assassinado pela PM de São Paulo. 

Reconhecemos as contribuições de Abdias do Nascimento, Lélia Gonzalez, do MNU e do outros atores e atrizes que organizaram a resistência negra brasileira para várias das conquistas que tivemos ao longo da década passada, como a aprovação do Estatuto da Igualdade Racial e a aprovação da Lei de Cotas n° 12.711/2012.

Nossa referência continuam sendo aqueles e aquelas que ao longo desses séculos organizaram os processos de resistência ao racismo estrutural e sistêmico no Brasil: da liderança de Dandara e Zumbi no Quilombo dos Palmares à juventude que se organiza nas praças das periferias das cidades brasileiras para reivindicar seu acesso aos espaços públicos e direito à cidade como um todo.

Para nós, o 13 de maio é a data em que reafirmamos as nossas dores, a nossa revolta e as nossas lutas para combater o racismo que tem organizado as nossas vidas por meio do Estado e das elites nacionais. Essa data é para dizer que não suportamos mais viver em condições desiguais e em situação de vulnerabilidade.

O 13 de maio é para reafirmar que queremos mais direitos! Mais acesso às políticas sociais, à moradia digna, à terra para produzir, ao mercado de trabalho formal e salário digno, à produção intelectual e acadêmica que valorize nosso saber ancestral, à demarcação de terra dos nossos quilombos e a viver uma vida plena sem medo de ser assassinado pela mão do Estado.

*Coletivo Enegrecer – Coletivo Nacional de Juventude Negra

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