A jornalista Malu Gaspar destaca, em sua coluna no Jornal O Globo, que “a informação de que o governo daria um reajuste salarial de 5% a todos os servidores públicos foi fundamental para Jair Bolsonaro conter o movimento grevista que ameaçava parar a Esplanada dos Ministérios em pleno ano eleitoral.
Passadas duas semanas, porém, o projeto de lei criando o reajuste não foi enviado ao Congresso, e auxiliares do ministro Paulo Guedes dizem que o Palácio do Planalto ainda não tomou a decisão de conceder o aumento.
Segundo esses auxiliares, as informações necessárias para o presidente Jair Bolsonaro tomar a decisão e autorizar o reajuste já foram enviadas à Casa Civil, a quem cabe editar o texto do projeto que altera o orçamento deste ano.
Até agora, porém, o ministério comandado por Ciro Nogueira não enviou o texto ao Congresso. Também não respondeu aos nossos questionamentos sobre a razão da demora e qual a data prevista para isso acontecer.
Foi só na Economia que consegui uma explicação para isso. “Ainda não houve decisão”, disse um auxiliar do ministro. “Não há comunicação oficial sobre isso”.
De fato, o anúncio de que Bolsonaro e os ministros Ciro Nogueira haviam decidido pelo reajuste foi divulgada de forma não oficial pelo governo, para todos os veículos de imprensa. Mas o próprio Bolsonaro não disse nada a respeito.
A questão é relevante porque, por lei, em ano eleitoral qualquer correção salarial só pode ser feita com antecedência de no mínimo 180 dias do pleito.
Isso significa que o poder Executivo tem que enviar o projeto ao Congresso, conseguir aprová-lo e ainda incluir os novos valores no contracheque dos servidores até primeiro de julho.
Na prática, portanto, o governo tem dois meses e uma semana para cumprir todo o rito – ou menos do que isso, já que nos bastidores do ministério da Economia se estima uma demora de duas ou três semanas para incluir todos os novos salários na folha do Executivo.
Para ter uma margem de segurança, então, seria necessário aprovar o projeto em definitivo no Congresso até meados de junho. Só que ele até agora não foi sequer. enviado pelo governo ao Legislativo.
Por isso, uma desconfiança toma conta de técnicos da Câmara dos Deputados que trabalham para os partidos da oposição: a de que a demora no envio do projeto de lei é uma jogada calculada para que ele não seja aprovado a tempo de cumprir o prazo estabelecido pela lei eleitoral e fique para 2023.
Esses técnicos temem que, se isso acontecer, o presidente Jair Bolsonaro venha a responsabilizar o Congresso pela falta do reajuste em 2022.
Nesse caso, o único aumento já garantido é o dos policiais. O plano inicial do governo era mesmo o de aumentar apenas os salários dos policiais federais, agentes e policiais rodoviários federais.
No caso do reajuste dos policiais não é necessário tomar nenhuma nova providência, porque esse aumento já foi aprovado e incluído na Lei Orçamentárias de 2022 via emenda de comissão.
Nas reuniões com funcionários do ministério da Economia sobre assuntos do legislativo, os assessores dos deputados notaram uma contida torcida para que não dê tempo de aprovar o reajuste.
“O Planalto está usando o calendário para dar o reajuste somente para quem eles querem, e já começou a procurar um culpado”, diz um dos técnicos que estão mapeando a operação do governo.
Se tiver que desembolsar mesmo os R$ 6 bilhões reservados para o aumento neste ano, o governo terá que fazer novos cortes no Orçamento. E essa é a principal razão pela qual o ministro Paulo Guedes nunca fez segredo de que era contra o reajuste.
Acontece que, desde que ficou claro que só os policiais receberiam aumento, diversas categorias se mobilizaram, entre elas a dos servidores do Banco Central e as da Receita Federal, que ameaçaram parar todo o governo a partir de 10 de maio.
Foi para tentar evitar essa greve que o Jair Bolsonaro anunciou o aumento, no último dia 13. A medida nem agradou aos servidores, que consideram que o percentual de aumento não cobre as perdas com a inflação.
Só que, se frustrar até mesmo esse aumento insuficiente, talvez não baste culpar o Congresso. Bolsonaro, portanto, tem duas opções: ou sacrifica o Orçamento ou prejudica seus próprios planos eleitorais.
Fonte: Jornal O Globo