O Senado Federal realizou, na tarde desta segunda-feira (09), uma sessão temática que debateu, junto com entidades representativas, o Projeto de Lei nº 6204/2019, que dispõe sobre a desjudicialização da execução civil.
O requerimento para a realização da sessão foi apresentado pelo senador Marcos Rogério (PL/RO), relator do projeto.
Durante a fala, o diretor de assuntos legislativos da Fenassojaf Julio Fontella chamou a atenção para a privatização do cargo executório imposta através da proposta. O dirigente reafirmou as competências dos oficiais de justiça para a função que, segundo ele, necessitam de melhores condições de trabalho, fazendo com que seja uma atividade de inteligência.
O representante da Associação Nacional se disse satisfeito com a preocupação quanto à celeridade do processo para o jurisdicionado, “mas os oficiais de justiça são os servidores aptos para o trabalho proposto no PL. É o oficial de justiça é quem deve realizar todos esses atos executórios”, indicou.
Para Julio, a intenção é que o debate seja profícuo para um melhor atendimento ao jurisdicionado e a toda a população.
Em atuação conjunta, o vice-presidente da Fesojus-BR Eleandro Alves Almeida disse que, “atualmente, 35 mil oficiais de justiça atuam como Agentes de Inteligência e Execução do Poder Judiciário e cabe a eles o papel que se propõe nesse PL”. O representante dos Oficiais estaduais defendeu o debate em prol da celeridade da execução em favor do cidadão. “Temos a capacidade técnica e jurídica para conseguir trazer os resultados objetivos do projeto”, finalizou.
O que dizem os magistrados e OAB sobre o PL 6204/2019
Representante da Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), a juíza do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, Dra. Marília Sampaio, reforçou a proposta de soluções para maior celeridade da execução civil.
De acordo com ela, a AMB possui preocupações quanto à adequação no ordenamento jurídico, uma vez que o processo, ainda que desjudicializado, continuará sob o crivo do Judiciário. “Em que medida esse sistema híbrido e de constante atuação conjunta entre magistrados e tabeliães, não será prejudicial ao objetivo da celeridade do processo?”, questionou.
A magistrada ressaltou que o devido processo legal dá ao jurisdicionado o direito a um processo coordenado por um agente público imparcial. “Além disso, os magistrados, na condução do processo, têm vedação contra custos ou participação em processo, participação partidária e o exercício da advocacia e outras atividades remuneratórias. Essa imparcialidade não está garantida na forma como está no projeto, pois os tabeliães nem sempre possuem todas essas características”.
Para a dirigente da AMB, a realidade da morosidade da execução não deve ser alterada com esse projeto de lei, seja na execução judicial ou extrajudicial. “A estrutura dos cartórios não possui a mesma estrutura que o Poder Judiciário, que tem os oficiais de justiça para a função que se pretende. Atualmente, o Judiciário possui acesso a sistemas informatizados, a exemplo do BacenJud”.
Integrante da Ordem dos Advogados do Brasil, Claudia Quintino afirmou que a desjudicialização é um passo de relevante mudança no sistema e precisa ser debatido com profundidade.
A sessão temática desta segunda-feira também teve a presença do presidente da Associação dos Notários e Registradores do Brasil (Anoreg) Claudio Marçal Freire e do jurista Joel Dias Figueira Júnior, ex-desembargador do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) e especialista em direito processual civil, que defenderam a implementação do projeto de lei da desjudicialização.
Após todas as falas, o relator do PL 6204 informou que apresentou substitutivo à matéria que, segundo ele, traz mais segurança jurídica para a questão com garantias constitucionais que não podem ser afastadas pelas vias ordinárias do processo administrativo.
O senador finalizou dizendo que está aberto para a apresentação de ideias e melhorias e que, até a próxima semana, irá consolidar o parecer para apresentação e pauta ao plenário.
Reunião com Oficiais de Justiça
Representantes do oficialato federal e estadual estiveram, na manhã desta segunda-feira, com o senador Marcos Rogério na tentativa de reaver os prejuízos trazidos pela matéria à execução no Brasil e ao jurisdicionado. A Fenassojaf esteve no encontro através dos diretores Julio Fontella e Márcio Soares, também presidente da Assojaf-DFTO.
Por mais de duas horas, os oficiais de justiça apresentaram argumentos e demonstraram que os dados citados na justificativa do PL estão incorretos e não condizem com a realidade do processo executório no Poder Judiciário.
“A partir dessa conversa, nós conseguimos que os oficiais de justiça fossem representados na sessão temática por duas entidades – Fenassojaf e Fesojus-BR, o que é uma grande conquista”, avalia Márcio Soares.
Para o dirigente, a partir do debate ocorrido na sessão temática, o senador Marcos Rogério abriu a possibilidade de que as entidades representativas apresentem sugestões e melhorias ao substitutivo, “o que também representa uma vitória. Nós reafirmamos que a solução para a execução no Brasil é o oficial de justiça e não a privatização”.
Na avaliação de Julio Fontella, a participação das entidades dos oficiais de justiça no debate sobre a desjudicialização foi essencial para demonstrar a importância desses servidores como Agentes de Execução do Judiciário. “Nós somos os servidores responsáveis pelas funções que o PL propõe e temos todas as condições para isso. O que necessitamos é de valorização e melhores condições de trabalho para garantir celeridade ao processo”, finaliza.
Além da Fenassojaf, estiveram reunidos com o senador Marcos Rogério os dirigentes Eleandro Almeida e Luiz Arthur de Souza (Fesojus-BR), Márcia Pissurno(Fenajufe), Eline Cavalcante (Assojaf/RO-AC) e Gerardo Alves (Sindojus/DF).
Modelo utilizado em países europeus
Durante o debate desta segunda-feira, os defensores da matéria reafirmaram que a medida seguirá o modelo utilizado por países europeus, em especial, em Portugal na celeridade dos processos na fase de execução.
Segundo o diretor de relações internacionais da Fenassojafe dirigente da União Internacional dos Oficiais de Justiça (UIHJ) Malone Cunha, essa é uma interpretação equivocada, uma vez que em Portugal a execução não é realizada por um tabelião, e sim por um solicitador, profissional liberal que não existe no ordenamento jurídico brasileiro. “Portanto, dizer que esse modelo se assemelha ao português é equivocado. A UIHJ não vê com bons olhos nenhum sistema no mundo que entrega a execução para um tabelião porque ela entende que o protagonista da execução deve ser o oficial de justiça”.
Malone Cunha reforça que a União Internacional não tem conhecimento, em nenhum lugar do mundo, onde o tabelião é o responsável pela execução, “pois, a função essencial do notário é o registro público e não cabe entregar a eles, como função atípica, aquelas estranhas à sua competência precípua”, finaliza.
A vice-presidenta da Fenassojaf e diretora do Sisejufe, Mariana Liria, avalia que o projeto ameaça de maneira substancial a própria imparcialidade do Judiciário e a garantia do acesso à justiça pelo cidadão brasileiro. A desjudicialização da execução civil sinalizaria no sentido da privatização da função jurisdicional, típica de Estado, privilegiando nesse sistema o exequente que dispõe de recursos financeiros. Ao fim e ao cabo haverá a criação de um abismo entre este e o jurisdicionado hipossuficiente, com o risco de, a longo prazo, ocorrer o sucateamento do sistema público. “O Sisejufe, através do Núcleo dos Oficiais de Justiça, e a Fenassojaf seguirão combatendo esse nefasto projeto privatista em todas as instâncias, na defesa não apenas das atribuições do oficialato, mas também dos milhões de desfavorecidos que necessitam de um sistema jurisdicional isento e acessível”, finaliza.
Caroline P. Colombo, especial para o Sisejufe