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Reflexão: Entre o “Atípico” e a Pessoa com Deficiência – Por que as palavras importam

card com imagens de páginas de jornais com marca d´água; ao centro está escrito ARTIGO em uma tarja vermelha; e acima da tarja tem a logo do Sisejufe do lado esquerdo

Nas discussões sobre inclusão e direitos das pessoas com deficiência, a linguagem tem papel fundamental. As palavras que escolhemos para nomear identidades não são neutras: elas carregam sentidos históricos, sociais e políticos. É nesse contexto que se torna necessário refletir sobre o uso do termo “atípico” em comparação com a expressão “Pessoa com Deficiência (PcD)”.

O termo “atípico” tem sido utilizado de forma crescente para se referir, principalmente, a pessoas neurodivergentes, como autistas. Embora à primeira vista pareça uma palavra mais suave ou acolhedora, ela traz consigo um risco importante: o de reforçar uma lógica que parte da norma – do “típico” – como referência, relegando o diferente a uma condição de desvio. Nesse sentido, ao nomear alguém como “atípico”, há uma comparação implícita com um padrão considerado “normal”, o que pode reforçar o capacitismo estrutural presente na sociedade.

Em contraste, o termo “Pessoa com Deficiência” não apenas reconhece a deficiência como parte da diversidade humana, mas é também um conceito jurídico, político e identitário. Ele está respaldado na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da Organização das Nações Unidas (ONU), ratificada pelo Brasil com equivalência constitucional, que afirma: “Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.”

Esse entendimento rompe com a visão exclusivamente médica da deficiência e afirma que o problema não está no corpo ou na mente da pessoa, mas nas barreiras sociais que impedem sua plena inclusão. Assim, o termo PcD vai além de uma classificação: é uma afirmação de identidade, de direitos e de luta. Ele reconhece a pessoa antes da deficiência, mas também não nega essa deficiência, e sim a valoriza como parte de sua existência no mundo.

Quando optamos por usar “atípico” como substituto de PcD, corremos o risco de apagar essa construção histórica e política. O termo “atípico” não contempla toda a pluralidade das deficiências – sejam físicas, sensoriais, múltiplas ou intelectuais. E mais do que isso, pode contribuir para uma espécie de eufemismo, como se falar abertamente sobre deficiência fosse algo a evitar ou suavizar.

Por isso, é fundamental promover a conscientização e a informação sobre a importância do termo Pessoa com Deficiência. Utilizá-lo corretamente é respeitar a história de luta dos movimentos de pessoas com deficiência, é reconhecer sua legitimidade enquanto sujeitos de direitos, e é afirmar um compromisso com uma sociedade mais justa e acessível.

Palavras têm poder. Elas constroem mundos, reconhecem existências, ou as silenciam. Ao escolhermos dizer “Pessoa com Deficiência”, estamos escolhendo o caminho do reconhecimento, da dignidade e da transformação social.

*Cláudia Helen de Araújo Teixeira é presidente da associação de culturas populares e tradicionais Rainha Ginga; vice-presidente da Associação dos Deficientes Visuais e Cegos de Cachoeira do Sul; coordenadora do Coletivo LGBTQIA+ Nicole Rocha; conselheira municipal da defesa dos direitos das pessoas com deficiência de Cachoeira do Sul; e consultora em áudio descrição.

 

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