O Sisejufe atua firmemente nas pautas em defesa dos servidores e servidoras do PJU. Nosso olhar, no entanto, vai além dos muros do Judiciário. Uma das nossas missões é caminhar em conjunto com entidades que trabalham em prol de questões sociais e de cidadania. Uma das parcerias mais antigas e exitosas é com o Instituto LAR. A entidade é uma organização sem fins lucrativos, que atua na cidade do Rio de Janeiro, e apoia o processo de reinserção social de pessoas em situação de rua. Juntos, Sisejufe e Instituto LAR implementaram, há oito anos, o projeto Primeiro Acesso à Justiça. Neste projeto, advogados voluntários e servidores do Judiciário Federal realizam o atendimento das pessoas em situação de rua, cuidando de todo o processo jurídico a fim de viabilizar a retirada de documentos, a concessão de benefícios assistenciais (BPC), assistência junto ao INSS, perícia médica judiciária e acompanhamento em audiências.
Os frutos desta parceria foram colhidos no 1º Encontro Nacional Pop Rua Jud, realizado pelo CNJ nos dias 25 e 26 de novembro, na cidade de São Paulo. É que o projeto “Primeiro Acesso à Justiça” foi escolhido como boa prática a ser replicada nos tribunais do país.
Ao inscrever a proposta no encontro, o Sisejufe argumentou que a criação de prática de voluntariado em orientações e apoio jurídico para acesso da população em situação de rua aos direitos sociais que envolvam acesso à renda, pode transformar muitas vidas. E a parceria com o Instituto LAR mostra isso na prática.
Entre seis eixos temáticos, o Sisejufe inscreveu sua proposta no 1º eixo – Cidadania, Identificação civil, Acesso à renda (Benefícios sociais e previdenciários). Os outros eixos trataram de aspectos criminais e processuais; violência estrutural; gestão e governança; saúde mental e uso de álcool e drogas; e moradia adequada e empregabilidade.
A proposta do Sisejufe foi apresentada no 1º Encontro Nacional Pop Rua Jud pelo secretário de Administração, Gestão de Pessoas e Patrimônio do sindicato, Valter Nogueira Alves. O dirigente participou dos dois dias de atividades, que foram organizadas em oficinas e palestras, entre outras ações.
AQ para servidores que participarem como voluntários
Nas oficinas, os participantes apresentaram as boas práticas e debateram os projetos que poderiam ser implementados. As discussões começaram a partir das propostas enviadas previamente e se desdobraram em novas sugestões. A do Sisejufe foi aprovada com a inclusão de Adicional de Qualificação (AQ) para incentivar a adesão de servidores voluntários ao projeto primeiro acesso à justiça.
Manual de boas práticas
A proposta apresentada pelo Sisejufe no 1º Encontro Nacional Pop Rua Jud fará parte do Manual de Orientação e Boas Práticas para a população em situação de rua, que deve ser publicado até o primeiro semestre de 2025.
Esse manual vai reunir e elencar as propostas aprovadas, de forma que os tribunais – e a rede de atendimento e acolhimento desse público – conheçam o que está sendo aplicado pelo país e se espelhem nas melhores práticas de implementação da Política de Atenção às Pessoas em Situação de Rua.
Os debates dos seis eixos temáticos foram realizados à luz da Resolução CNJ n. 425/2021 (leia ao final da matéria) e contaram com a participação de representantes do Judiciário, sistema de justiça, academia e Movimento Nacional de Pessoas em Situação de Rua (MNPR).
A publicação trará as iniciativas divididas pelas questões temáticas. No eixo 1 Cidadania – Identificação Civil e Acesso à Renda, o tema é a garantia do direito à documentação civil e ao acesso a programas sociais e benefícios previdenciários, fundamentais para a inclusão social das pessoas em situação de rua. Foram debatidas 17 propostas, das quais 12 foram aprovadas.
Nos aspectos criminais e processuais, o eixo 2 focou nas particularidades do sistema de justiça criminal, abordando a reintegração de egressos do sistema penal, o cumprimento de penas e a situação de rua como um contexto que pode agravar a vulnerabilidade dessas pessoas. Foram desenvolvidas, durante os debates, 17 propostas, das quais 15 acabaram aprovadas, todas tendo o Plano Nacional Pena Justa como norte.
Já as formas de opressão – como racismo, homofobia, machismo, etarismo – que afetam a população em situação de rua foram discutidas no eixo 3 Violência Estrutural e Interseccionalidades. Essas questões que ampliam a exclusão social e vulnerabilidade foram abordadas em nove propostas de boas práticas aprovadas pelo grupo.
No eixo 4, houve a aprovação de 14 medidas, todas voltadas à “Gestão e governança – Rede interinstitucional, medidas administrativas, acesso à justiça”. Os debates trataram da organização de fluxos permanentes de atendimento, da importância da cooperação entre instituições, e do fortalecimento de mutirões e ações de capacitação voltadas a essa população.
Quanto à Saúde Mental e Uso Abusivo de Drogas e Álcool, o eixo 5 trouxe nove propostas – todas aprovadas – relacionadas à questão, com foco no desenvolvimento de políticas de cuidado. E o eixo 6, por sua vez, reuniu as iniciativas para Moradia Adequada e Empregabilidade. As sete medidas que foram aprovadas estão voltadas não apenas às questões referentes ao direito à moradia digna, mas também à inclusão dessa população no mercado de trabalho, como meio de promover sua autonomia e integração social.
A questão trabalhista também foi apontada pelo conselheiro do CNJ Guilherme Feliciano, que participou das discussões do eixo 6. Os trabalhos realizados pela população em situação de rua – como catadores e reciclagem – não são observados pelo poder público. De acordo com Feliciano, isso significa uma invisibilidade, inclusive institucional. “Esses trabalhadores ficam à mercê de situação análoga à de escravidão. É preciso um olhar mais cuidadoso em relação à situação da empregabilidade dessas pessoas”, destacou. Para ele, as políticas para essa população servem para dar visibilidade a essas pessoas marginalizadas.
Mais sobre o encontro
O 1º Encontro Nacional Pop Rua Jud contou com a participação de cerca de 400 pessoas. A abertura contou com a presença do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do CNJ, ministro Luís Roberto Barroso, que abriu os trabalhos no salão nobre da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (FADUSP).
“Este é um evento que lida com uma das questões mais complexas que enfrentamos no Brasil. Hoje, pelas estatísticas, existem cerca de 300 mil pessoas em situação de rua. O problema é grave e crescente, mas ainda é administrável. Portanto, temos imensa preocupação de cuidar desse assunto”, pontuou o magistrado.
O ministro do STF, Alexandre de Moraes, proferiu a aula magna do evento sobre a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 976/DF, do qual é relator. Ele lembrou que a decisão, tomada há um ano e meio, estabelece que gestores estaduais e municipais atendam as demandas da população em situação de rua. O magistrado apontou os desafios e a necessidade de que o Estado entenda os reais motivos que impedem a superação da situação atual.
As oficinas que promoveram as discussões dos eixos temáticos também aconteceram no primeiro dia do encontro.
No segundo dia (26/11), representantes das pessoas em situação de rua expressarem opiniões na 4ª reunião do Observatório dos Direitos Humanos do Poder Judiciário, realizada no salão nobre da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (FADUSP). Foram apresentadas sugestões a respeito do impacto das questões climáticas sobre a população em situação de rua, das dificuldades para a emissão de documentos e da atuação conjunta dos Poderes para solucionar demandas desse público.
Também presente no evento, a secretária-geral do CNJ, Adriana Cruz, ressaltou que o Conselho está aberto a receber propostas da sociedade brasileira. “Nossa intenção é ouvir as pessoas que usufruem das políticas judiciárias, para que possamos construir juntos soluções efetivas para os problemas reais”, disse.
Além de transformar as manifestações dos participantes em ações, o CNJ deve encaminhar as medidas aos órgãos responsáveis. “As propostas relacionadas à documentação e a questões cartorárias, por exemplo, serão trabalhadas juntamente com a Corregedoria Nacional de Justiça. O que for de competência de outros Poderes, também será encaminhado”, afirmou.
Prêmio Pop Rua Jud
O “1º Encontro Nacional Pop Rua Jud” foi encerrado com a entrega do Prêmio Pop Rua Jud. A premiação tem a finalidade de reconhecer e divulgar iniciativas que promovam a melhoria do acesso à Justiça para a população em situação de rua. Mais de 30 iniciativas foram inscritas para o prêmio. As práticas promovem a inclusão social e o acesso à Justiça de forma eficiente e humanizada e podem ser disseminadas pelo país.
Na categoria “Impacto Social e Transformação”, sagrou-se vencedora a prática “Centro de Atendimento Integrado às Pessoas em Situação de Rua”, do Comitê Interinstitucional de Atenção à População em Situação de Rua do Rio de Janeiro.
Em segundo lugar, foi escolhida a prática “Rualogia: das marquises para a luta, conhecer para lutar”, desenvolvida pela Defensoria Pública do Estado do Mato Grosso e pelo Movimento Nacional da População de Rua.
O terceiro lugar foi concedido à prática “Incluir para Recomeçar”, do Tribunal de Justiça do Acre (TJAC). A menção honrosa foi para a prática “Cejusc PopRuaJud”, do Tribunal de Justiça do Amapá (TJAP).
Na categoria “Inovação na Prestação de Serviços Judiciais”, foi vencedora a prática “Sexta Restaurativa PopRuaJud”, também do TJAP. Em segundo lugar, “PIDJus PopRua”, do TJAC.
Em terceiro, foi escolhida a prática “Atende Juris Pop Rua”, do Tribunal Regional Federal da 6ª Região. Recebeu a menção honrosa a prática “Atenção Diferenciada à Pessoa em Situação de Rua no Âmbito da Metodologia APEC”, do Tribunal de Justiça de Minas Gerais.
O Judiciário e a população em situação de rua
A Política de Atenção a Pessoas em Situação de Rua e suas Interseccionalidades foi instituída pelo Poder Judiciário, por meio da Resolução CNJ nº 425/2021. Uma das diretrizes do normativo é assegurar amplo acesso à justiça às pessoas em situação de rua, de forma célere e simplificada, contribuir para superação das barreiras decorrentes das vulnerabilidades econômica e social e da situação de precariedade ou ausência habitacional. A Resolução prevê o desenvolvimento de ações por meio de redes interinstitucionais. Clique NESTE LINK para conhecer a Res CNJ 425/2021.