“Há sempre novas conquistas, apesar de todos os riscos. O caminho é longo, mas é bonito”
Pedro Paulo Leal*
Em meio a tantas campanhas, reivindicações, mobilizações, manifestações sobre carreira, um assunto extremamente importante acaba ficando esquecido. É o ativismo sindical, desempenhado por aqueles que, sendo diretores ou não dos sindicatos representantes de sua categoria, recebem sobre si os encargos oriundos de uma luta que beneficiará a todos.
Ainda que o ativista, em seu ambiente particular de trabalho, receba a compreensão de seus superiores hierárquicos mais diretos, pois acompanham de perto a dedicação empreendida nas atividades sindicais, o que prevalece sempre é “a mão invisível” institucional que, por meio de seus “tutoriados”, continuam a imprimir, veladamente, a mensagem de que tudo é compreensível, desde que as regras sejam estritamente cumpridas.
Não há ativista que já não tenha escutado a seguinte pérola: “Nós apoiamos a atividade sindical; reconhecemos a importância de uma luta que é justa a todos; sabemos o grande significado que um sindicato tem para o avanço das conquistas sociais…”; e de blá-blá-blá em blá-blá-blá, vem a pérola final “… porém é preciso fazer a compensação do horário…”.
A contradição “cartesiana” demonstra a irreflexão que esse argumento, utilizado com demasia – ou tentativa de maestria – traz em si. Afinal, se juntarmos todas as horas oriundas das necessidades pessoais de cada um, seja um filho na escola, uma demanda médica, um cuidado com os pais ou o tempo dedicado aos estudos, e somando aí a vontade de se dedicar ao exercício sindical, fica impossível a compensação de todas as horas, inviabilizando qualquer participação efetiva no trabalho sindicalista.
Seria até perda tempo argumentar que acordou às 5h da manhã, para se preparar e sair rumo àquela cidade distante 400 km da sede sindical, para levar material de apoio e palavras de incentivo aos companheiros que, distante da capital, encontram enormes obstáculos em suas mobilizações. Sem esquecer que o retorno ao lar, após quatro horas de ida, mais quatro horas de volta, se dá normalmente por volta de 9h da noite.
Pouco importa se você sobe ou desce a serra, e depois sobe novamente para outra e novamente desce, e se desloca para outra localidade, em apoio aos companheiros sistematicamente pressionados a não participarem de qualquer mobilização, com ameaças de retaliações, inclusive. Saídas para assembleias e, após ao comparecimento de reuniões, onde o que foi decidido minutos antes ganha as medidas necessárias para se tornarem reais. Nada disso é levado em conta.
Você é um ativista sindical e ponto. Para você aquela costumeira chegada de 30 minutos de atraso, o almoço de 10 minutos que vira 40 ou a fugida para aquele trago no cigarro que ao longo do dia se transformam em menos de uma hora de trabalho, nada disso vale para a comparação. Seu trabalho tem que ser integral, assim exige a “mão invisível”, que se cerca de normas, portarias, resoluções, enfim de um ordenamento jurídico que somente vale o que está escrito, ainda que esse escrito seja aplicado apenas a você, ativista sindical.
Outro argumento a seu desfavor são as catracas eletrônicas que, dia a dia, em prol da “eficiência administrativa” são instaladas em todos os ramos do trabalho, publico ou privado. E o sorriso sutil, os comentários “sugestivos” de que todo o tempo não rigorosamente cumprido pode ser constatado. Ignoram, talvez por falta de informação suficiente, que o simples mencionar desse fato já se configura no assédio moral, e que todo e qualquer levantamento informal ou extra oficialmente, individual, é passível de judicialização tanto para quem solicitou a informação quanto para aquele que, sem o amparo legal, a tenha fornecido. Constata-se que, nessa hora, todo o ordenamento jurídico citado acima é desconsiderado.
Para quem ainda se impressiona com as ameaças surgidas em todos os níveis de hierarquia funcional, vale lembrar que esse tipo de informação só é possível – enquanto não exista regulamentação que a sustente – em caso de levantamento estatístico geral. Esmiuçando, não pode se limitar a um trabalhador unicamente ou a uma unidade específica, mas ao conjunto dos trabalhadores daquele ramo de atividades, sem distinção de graus hierárquicos existentes.
Ainda assim, nem adianta argumentar que suas ausências não prejudicam o ambiente de trabalho, nem sobrecarregam o seu colega ao lado, já que, ciente de suas obrigações, consegue manter o trabalho delegado perfeitamente em dia. Desista, assuma que se ausentou e pronto, Não desperdice seu tempo. Você já está cunhado. Grevista para uns, malandro para os outros, assim é o ativista sindical.
E também não vá perder tempo em apontar as contradições institucionais. Afinal, em tempos de teletrabalho é difícil admitir que, se você é capaz de trabalhar em casa ou qualquer outro local, gerindo seu horário com autonomia, desde que cumpridas às metas estabelecidas, você não pode, após cumprir suas metas no próprio local de trabalho, se dedicar ao ativismo sindical. Contradição das contradições, tudo é contradição.
A gaiola está ali, prontinha, certinha. “Sala refrigerada, água, cafezinho, cadeira ergonômica, para que se mexer?” Ou então coladinho ao pelourinho nosso de cada dia, garantido pelas benesses concedidas pela “mão invisível”. Mas para o ativista sindical nada disto basta, ele é chato, se veste mal, tá com suor no rosto. E ninguém entende que esse suor é reconfortador, pois é fruto das opções políticas e ideológicas que, lá atrás, foram tomadas. Viraram convicções, cresceram e se fortaleceram para romper o silêncio e denunciar as situações ilusórias de conforto, que num simples mexer fazem pesar as correntes que nos aprisionam. As opções foram tomadas, as escolhas foram feitas, só nos resta seguir. Há sempre novas conquistas, apesar de todos os riscos. O caminho é longo, mas é bonito. E roubando a palavra do companheiro sindical Jacy Afonso, “Sindicatear é preciso”.
*Pedro Paulo Leal é representante de base do Sisejufe e ervidor da Justiça Federal/Almirante Barroso