Leia aqui o artigo que discute o aniversário de cinco anos da Lei 10.639/03, que regula o ensino de História e Cultura Afrobrasileira, escrito por Maria Lúcia de Santana Braga, que é socióloga e técnica do Ministério da Educação (MEC).
O aniversário da Lei 10.639/03 e a justiça para a população negra
Por Maria Lúcia de Santana Braga* – 10/01/08
No dia 09 de janeiro de 2008, a Lei 10.639/03, ensino de história e cultura afro-brasileira, completa cinco anos, o que se coloca como momento propício para breve reflexão sobre a sua implementação.
Diversos estudiosos e especialistas têm regularmente sinalizado para o fato de que as iniciativas por parte do Estado têm sido insuficientes ou bastante frágeis, pois não conseguem articular pelo menos dois eixos relevantes em direção a uma educação anti-racista: a formação de professores e a elaboração de material didático-pedagógico. Além disso, a relação entre os entes federativos (municípios, estados, União e Distrito Federal) revela-se uma variável bastante complexa na implementação das políticas educacionais. No caso da educação das relações étnico-raciais, isto não seria diferente.
Usualmente, o processo de implementação de uma política implica em tomada de decisões, em redefinição dos implementadores diretos e indiretos e, fundamentalmente, na construção de redes de implementação que envolvam os diferentes agentes públicos.
No caso do ensino de história e cultura afro-brasileira, conforme prevê a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) no artigo 26-A, esse ciclo da política ainda é incompleto, visto que a sociedade e o próprio Estado não elegeram a educação como espaço de mudança do padrão de valores culturais que informa o comportamento de alunos, professores e demais atores sociais.
Mesmo com os esforços continuados nos últimos anos por parte do Ministério da Educação na construção de uma agenda educacional que contemple as políticas públicas afirmativas para a população negra, os obstáculos são variados e remetem para a necessidade da adoção de um conceito bidimensional de justiça, nos termos propostos pela cientista política Nancy Fraser.
Fraser entende que a justiça no mundo contemporâneo exige simultaneamente pensar em redistribuição e reconhecimento. Isso significa que freqüentemente o dilema entre a distribuição mais justa dos recursos e bens produzidos pela sociedade entre as diversas classes e grupos ou a necessidade do reconhecimento das diferenças dos grupos e identidades é equivocado. Por exemplo, ao tratar da categoria raça, a autora lembra que os grupos sofrem tanto injustiças distributivas, quando da falta de reconhecimento, devido a fatores econômicos e culturais.
O reconhecimento da contribuição da população negra na construção da cultura e da sociedade nacional é um problema de justiça, que somente será possível solucionar com a mudança do padrão de valores culturais. Portanto, a escola é o espaço no qual uma nova estrutura de sentimentos humanista, anti-racista e democrática poderá se desenvolver e contribuir para a emancipação tanto da população negra como também de toda a sociedade brasileira.
* Maria Lúcia de Santana Braga é socióloga e doutora em Sociologia, é técnica do Ministério da Educação (MEC).