O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou em despacho publicado na noite deste domingo que o dinheiro público utilizado em programas sociais de renda básica, como o Auxílio Brasil, não está inscrito na regra do teto de gastos. Ele também garantiu a legalidade de se pagar o benefício através da abertura de crédito extraordinário, sem necessidade de mudança constitucional. A decisão, na prática, oferece uma saída para o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) manter o pagamento de R$ 600 no futuro Bolsa Família mesmo sem conseguir aprovar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da transição.
Aprovada no Senado, a PEC da transição, que muda o teto de gastos para garantir o pagamento de R$ 600 do Auxílio Brasil no ano que vem, está travada na Câmara em meio à pressão do Centrão por ministérios e espaços no futuro governo.
Caso o presidente eleito opte por um plano B para financiar o pagamento de R$ 600 do benefício, ele terá agora maior segurança jurídica. O plano B, respaldado pela decisão do ministro, é a abertura de um crédito extraordinário por meio de uma medida provisória (MP) para bancar o programa.
Nesta segunda (19/12), foi tomada uma outra decisão que também deve facilitar o início da nova gestão no Palácio do Planalto: o plenário do STF decidiu, por maioria, derrubar o orçamento secreto. As duas decisões dão poder a Lula e enfraquecem o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). As tentativas de negociação da transição com Lira haviam estagnado. Leia neste link sobre a decisão de derrubar o orçamento secreto.
Veja, abaixo, o que é a decisão de Gilmar Mendes e como ela mexe com a PEC da Transição.
Por que o ministro Gilmar Mendes determinou que o Bolsa Família fique fora do teto de gastos?
Gilmar Mendes atendeu a um pedido da Rede Sustentabilidade, partido que apoiou Lula nas eleições deste ano.
Na prática, o que essa decisão permite?
Essa decisão reduz a pressão sobre o governo eleito para a aprovação da PEC da Transição, que já foi aprovada no Senado, mas está travada na Câmara a menos de duas semanas da posse de Lula. Ela dá mais segurança jurídica para uma outra alternativa de financiamento do programa: a abertura de crédito extraordinário por medida provisória (MP). A equipe de Lula temia essa alternativa diante da possibilidade de quebrar regras fiscais, o que poderia levar a crime de responsabilidade. A decisão de Gilmar, portanto, dá mais segurança ao governo eleito de que pode lançar mão do plano B, caso necessário, e que conseguirá viabilizar sua principal promessa de campanha.
A decisão de Gilmar invalida a PEC da Transição?
Não. A PEC, se aprovada como está, vai permitir ampliar o teto em 145 bilhões para o programa social. A liminar de Gilmar, porém, permite abrir crédito extraordinário apenas para pagar o restante para completar os R$ 600 – valor avaliado em R$ 52 bilhões.
Com a decisão de Gilmar, o que acontece se a PEC for aprovada?
Após a decisão de Gilmar, se a PEC for aprovada como saiu do Senado, Lula poderá assinar uma medida provisória aumentando o Bolsa Família e usar o valor da PEC em outro lugar. Por conta disso, haverá pressão para desidratação do valor da proposta na Câmara. Dirigentes do Centrão só concordam em aprovar o valor solicitado pelo presidente eleito se o grupo ganhar ministérios e cargos e controlar as verbas liberadas pela proposta.
O governo eleito pretende insistir na PEC da Transição mesmo com a decisão de Gilmar?
A PEC da Transição continua a ser o plano A do governo eleito, como declarou o futuro ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Isso porque a decisão de Gilmar libera o futuro presidente para aumentar o Bolsa Família de R$ 400 para R$ 600, ampliando o valor previsto atualmente no Orçamento de 2023, fora do teto de gastos, mas não resolve outros gastos que Lula quer liberar com a aprovação da PEC, como o benefício extra de R$ 150 por criança de até seis anos, promessa de Lula os recursos para recompor as áreas de saúde e educação e a construção de obras públicas no próximo mandato.
A decisão de Gilmar pode ir a plenário do STF?
Pode, mas esta segunda, 19, é o último dia de funcionamento do STF em 2023. Portanto, para isso, teria de haver uma sessão extraordinária até a meia-noite, ou só no ano que vem. Se fosse para ir a plenário de forma presencial, o julgamento já teria de ter sido pautado anteriormente. A única saída para votar ainda hoje seria um plenário virtual. No entanto, até o momento, nada está programado.
Fonte: Estadão e UOL