A Câmara Municipal do Rio de Janeiro promulgou, em 23 de dezembro, ao apagar das luzes do ano de 2020, a Lei Complementar nº 226, que altera o regulamento de zoneamento de áreas públicas, permitindo, na prática, a redução do espaço destinado aos pedestres nas calçadas. A Lei define que a parte frontal de edificações voltadas para logradouros públicos, sobretudo bares e restaurantes, pode ser utilizada para a colocação de mesas e cadeiras.
A norma determina o fim da obrigatoriedade da largura mínima das calçadas – 4 metros, com um espaçamento livre de 2,5 metros – para a passagem de pedestres. A partir de agora, a exigência será de apenas 1,2 metro. Para o Departamento de Acessibilidade e Inclusão (DAI) do Sisejufe, a medida é absurda porque vai prejudicar a circulação dos pedestres, principalmente as pessoas com deficiência, que precisam de espaços seguros e sem obstáculos para se locomover.
“Muito nos assombra esta lei. Tudo nela nos causa estranheza, principalmente a velocidade com que foi aprovada e a enorme maioria de votos na casa legislativa municipal. Apenas dois honrosos votos contrários a este atentado à acessibilidade urbana. Até onde pudemos acompanhar, tal lei está eivada de inconstitucionalidade e também vícios de ilegalidade. Verificamos que não foram convocadas audiências públicas que discutissem o tema e nem mesmo o Conselho Municipal dos direitos da Pessoa com deficiência (Condef Rio) foi sequer ouvido durante sua tramitação na Câmara de Vereadores. Em resumo, a sociedade carioca, principal interessada no tema, não foi ouvida”, critica o diretor do Sisejufe e coordenador do DAI, Ricardo Azevedo.
Pela norma aprovada, a área ocupada por mesas e cadeiras deverá ser demarcada fisicamente, de forma que a faixa destinada à circulação de pedestres possa ser identificada, tanto pelos usuários quanto pela fiscalização, podendo ser pintada ou sinalizada por meio de faixas de marcação removíveis, faixas adesivas sobre o piso, tapetes, gramas sintéticas, carpetes ou similares. As áreas destinadas à colocação de mesas e cadeiras poderão ser delimitadas por muretas, gradis ou jardineiras, com altura máxima de um metro, desde que sejam removíveis. Será permitido, ainda, a utilização de móveis ou anteparos para serviço de alimentos ou bebidas, inclusive aparador, bancada ou equipamentos similares. A pretexto de ser favorecer os setores de gastronomia e turismo, a nova lei prejudica a acessibilidade da população nos espaços públicos da cidade do Rio de Janeiro.
Para o diretor do Sisejufe, interesses de donos de bares e restaurantes da gastronomia carioca jamais poderiam sobrepujar direitos coletivos constitucionalmente garantidos.
“O direito de ir e vir do individuo é garantia inalienável e deste modo deve ser conservado. Infelizmente, o que esta lei vem fazer é tornar legal uma prática que já vinha ocorrendo há vários anos em nossa cidade. Não podemos admitir que um hábito equivocado e que atropela direitos coletivos possa tornar-se legal do ponto de vista jurídico. Precisamos lutar contra esta teratologia jurídica carioca. Nós, pessoas com deficiência, não admitiremos que nossos direitos sejam vilipendiados de tal forma”, ressalta Ricardo Azevedo.
Foto: Divulgação / Descrição da imagem: mesas e cadeiras de um restaurante ocupam parte da calçada em espaço público