Por Henri Figueiredo*
Há uma diferença extraordinária entre ler sobre algo, seja um projeto, uma história de vida, um fato que houve com alguém em situação de vulnerabilidade social e ouvir essa mesma história. Ou, ainda, ver ou viver essas histórias. É possível afirmar que o Departamento de Gestão Social do Sisejufe viveu, de certa maneira, parte de histórias de desamparo, de dificuldades, de injustiças e de desigualdades na noite de quinta-feira, 14 de abril. Mas também presenciou uma alta voltagem de disposição para a superação dos problemas e de projetos tocados por gente que luta, todo o dia, para ajudar o outro, para vencer obstáculos, para não deixar morrer a esperança de dias melhores.
O convite para a videoconferência partiu da técnica judiciária Larissa Azevedo, 36 anos, da Seção Judiciária do Rio de Janeiro e que é a coordenadora do Departamento de Gestão Social do Sisejufe. “Muitos desses projetos já existem há 7, 10 anos; outros são bem recentes. Que a gente consiga passar por esse momento de pandemia com mais solidariedade entre o movimento sindical e os movimentos sociais. Vamos procurar um a um para sabermos no que podemos ajudar de maneira mais imediata”, afirma Larissa. A videoconferência também foi importante para as diretoras e diretores que integram este departamento terem contato com as histórias de cada causa, para além do que já foi registrado no planejamento do sindicato.
O Sisejufe tem trabalhado com o conceito de que o sindicalismo e o movimento comunitário precisam superar as barreiras que separam a luta dentro de comunidades da luta sindical e, assim, construir uma rede de apoio, de mobilização e de articulação política para produzirem e implementarem projetos e políticas públicas que atuem sobre os processos políticos, econômicos, de gênero, sanitários, étnico-raciais e ambientais de fortalecimento de coletivos e movimentos sociais que atuam nas comunidades – em torno de um programa combativo, reivindicativo e
democrático. Este conceito conecta-se diretamente com os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Organizações das Nações Unidas, na Agenda 2030.
O sindicato entende que pandemia é também um “vírus de classe” que atinge, principalmente, os moradores de favelas e periferias, negros e pobres. Por isso, construir vínculos comunitários, gerar debates sobre as condições de vida, fomentar o apoio mútuo, o fortalecimento, a autoproteção e autodefesa comunitária constrói pontes solidárias na luta da classe trabalhadora contra essa crise civilizatória e sanitária.
A presidenta do Sisejufe, Eunice Barbosa, presente à reunião, começou sua fala lembrando que já esteve à frente deste departamento. “Inicialmente se chamava Sisejufe Solidário e a gente já vem numa parceria de alguns anos com alguns projetos, especialmente com o Instituto Lar e com a Fina Batucada. É uma alegria trabalhar com vocês. É para o Sisejufe uma honra acolher os novos parceiros, o nosso desejo é ampliar essas parcerias numa construção coletiva de políticas públicas”, disse Eunice em sua saudação inicial.
De acordo com a dirigente Eunice, “temos uma ação no sindicato que é tratar com muita atenção os projetos que têm mulheres à frente e dar suporte para que outras mulheres também alcancem o protagonismo nas suas lutas”. Ao final da reunião, concluiu: “Quero agradecer a todos e todas que trouxeram suas lutas, seus sonhos, seus projetos. Isso é só o começo. Com certeza teremos muitas outras oportunidades para tecermos juntos essa rede de solidariedade. Vocês podem contar conosco”.
Lucena Pacheco Martins, diretora administrativa do Sisejufe, está acompanhando a construção dos métodos dessas parcerias para dar o melhor encaminhamento a esses vínculos. “Ninguém vive isolado em campo nenhum. Considero muito bom que o sindicato tenha essa visão de integração, para além da manutenção de direitos da nossa categoria, incluindo quem está fora do mundo formal do trabalho e a gente precisa caminhar juntos para desenvolver o bem-estar social e uma condição melhor de vida para todo mundo”, disse Lucena.
A assessora política do Sisejufe, engenheira Vera Miranda, lembrou que há poucos anos, o sindicato teve uma primeira tentativa de construção de uma rede de solidariedade através do Departamento de Movimentos Sociais com o pessoal do MPA, do MST e outros – com os quais, segunda Vera, o Sisejufe voltará logo a reunir. “Uma proposta para continuarmos esse sistema de trocas é pensarmos o que cada projeto pode ajudar a outro projeto. E o Sisejufe pode ajudar a articular e fazer que isso seja potente”, propôs Vera.
O que disse cada parceiro e parceira do Sisejufe
ARNALDO GAMA – técnico administrativo da UERJ
Projeto “Há Gente na Rua”
“Muito importante esta relação estabelecida com o sindicato, que já é histórica. Atuo há cerca de 5 anos na questão social da população de rua – e foi nessa luta que eu conheci o Sisejufe. Atualmente estou na coordenação do projeto ‘Há gente na rua’, que surgiu com a pandemia. A ideia surgiu como um portal porque uma das dificuldades que eu tive nos últimos anos, atuando nesta área, foi encontrar um local que reunisse legislação, informação, a articulação – e aí é o principal elo do projeto com o movimento nacional da população de rua para a organização. Estou também a coordenação do Fórum Permanente da População em Situação de Rua. Nós temos a página na internet, Instagram, Facebook, então a ideia é tentar trazer a visibilidade dessa população e da luta política pelos instrumentos como o Movimento Nacional da População em Situação de Rua (MNPR) e, agora, está surgindo outro movimento em São Paulo – que também terá abrangência nacional. Há um projeto que a gente vem pensando muito seriamente e vi a necessidade de ser realizado no Rio que é a qualificação política, formação política de quadros movimento da população de rua – para depois da pandemia. Temos alguns modelos, como o do próprio MST, talvez possamos reproduzir isso no Rio.
REINIER CROHARE MOLINA – coordenador de Desenvolvimento Comunitário do Circo Crescer e Viver
Projeto Vozes do Território – Mulheres
“Temos atuado em três diferentes frentes: a) desenvolvimento de crianças e jovens; b) desenvolvimento comunitário; e c) desenvolvimento sociocultural. No momento estamos com o Projeto Vozes do Território, que é de suporte e apoio para iniciativas e empreendimentos liderados por mulheres. Começamos em dezembro de 2020 e oferecemos mentoria e agora faremos um aporte de um financiamento não reembolsável para esses empreendimentos. Nossa ideia surge a partir de uma pesquisa de perfil socioterritorial que fizemos na Cidade Nova – que inclui o complexo de favelas do São Carlos e uma parte do Catumbi. A pesquisa foi feita com 1.712 pessoas de referência e mostrou que as mulheres são a maioria das lideranças familiares e também as que mais sofrem com o desemprego. Uma das ações que desenvolvemos foi dar suporte pra essas mulheres começarem a empreender em casa. Criamos um programa que envolve consultoria e, o principal, que é o aporte de recursos. Também ajudamos na formalização do empreendimento, produção, com planejamento estratégico e redes de contatos como, por exemplo, conectando essas mulheres com outros empreendimentos que podem comprar a sua produção. Nosso projeto é de suporte e apoio a essas mulheres. Parte desses empreendimento é de impacto social e a gente quer fortalecer essas iniciativas. O território, para ser vibrante, depende que tenha muitos movimentos e organizações. No geral é aquele empreendedorismo de necessidade. A gente também está distribuindo renda básica para mais de 500 famílias e criamos um painel com o perfil socioeconômico dessas famílias.
PRISCYLA CORRÊA – técnica administrativa da UERJ
Projeto Fina Batucada
“Eu conheço há muitos anos a Fina Batucada, onde toco e auxilio administrativamente o projeto há mais de 10 anos. O projeto da Fina Batucada com a Patota do Galo tem o objetivo de capacitar os jovens da comunidade do Cantagalo. Atendemos, através desenvolvimento na área musical, cerca de 50 de crianças e adolescentes em condições de risco social e pessoal para sua inserção e permanência no mercado de trabalho, a fim de garantir geração de renda e desenvolvimento de cidadania.
MESTRE RIKO – músico
Projeto Fina Batucada
“O projeto Fina Batucada já tem mais de 20 anos é de 99,9% de mulheres, de todas as idades. Procuramos a capacitação através da música como um todo. Lugar de mulher é onde ela quiser. Pela Fina Batucada já passaram mais de mil e tantas meninas.”
LAÍS VIANNA – maestrina e instrumentista
Projeto Fina Batucada
“Eu sempre soube que queria fazer música mas, em Campo Grande, eu não tinha como fazer essa atuação. Foi através de uma iniciativa da Fina Batucada, do seu papel social, que hoje eu estou aqui. Sou diretora da Fina Batucada, já estive à frente de alguns blocos, como maestrina, como o Bafo da Onça (que é super conhecido). A Fina Batucada me apresentou uma oportunidade de ‘ser’ para além do que a minha região poderia me proporcionar. Me tornei instrumentista, hoje sou professora de música. Trabalho, inclusive, com capacitação para professores de música. E tudo começa através de uma pessoa. Às vezes, a gente imagina que as iniciativas precisam ser grandiosas quando, na verdade, um professor pode mudar a vida de uma pessoa. Eu acredito muito em todas as iniciativas que aqui estão apresentadas e, obviamente, na Fina Batucada porque eu sou reflexo dessa realidade. Pude ter uma profissão e me colocar como ser existencial no mundo. Além de conhecer tantas coisas que desconhecia, como a importância da mulher na sociedade; a possibilidade de uma mulher negra, da periferia, filha de motorista de ônibus e de empregada doméstica, poder ter uma ascensão pessoal muito grande. Eu não falo só da minha história, sou uma pessoa comum, mas das tantas pessoas que terão suas vidas transformadas através dos projetos que estão sendo apresentados aqui. Tento não ser muito pessoal, mas é impossível não ser muito pessoal quando a gente fala de projetos como estes, que mudam vidas. Estamos num momento histórico em que muitas das nossas lutas vêm à tona: de aceitação, de acessibilidade, de gênero, de sexualidade. Qualquer pessoa que se dispõe a doar seu tempo para tentar mudar a realidade de um local, já faz uma coisa grandiosa – mesmo que o movimento ainda seja pequeno.”
LEONARDO NIA
Escola Quilombolista Dandara de Palmares
“Sou um dos membros e fundadores da Escola Dandara de Palmares. Surgiu da vontade de nós, moradores e moradoras do Alemão, que precisávamos garantir a educação para as crianças. A primeira necessidade que percebemos foi superar o analfabetismo funcional. Começamos a fazer atividades culturais e percebemos esses déficits. Aí fundamos essa escola que pudesse ensinar, primeiro, a alfabetização e depois o restante: matemática, literatura, história, física, de uma forma que muitas vezes a escola tradicional não ensina. E também de maneira mais lúdica para que as crianças pudessem ter interesse e identificação. Atendemos 45 famílias há 3 anos. Somos autônomos, completamente, porque isso nos dá liberdade de atuar no nosso território com liberdade para fazer o mais interessante para as nossas crianças. Um dos motes principais da nossa escola é nossa definição de racismo: ‘Quando o racismo não nos mata, ele nos encarcera, quando não nos encarcera nos enlouquece e quando não nos enlouquece, ele não nos permite desenvolver todo nosso potencial humano’. Então nossa escola é voltada para crianças negras do Complexo do Alemão para que desenvolvam todo seu potencial humano numa perspectiva comunitária.”
Leonardo completou: “com a pandemia, nos tornamos um polo de apoio de combate à covid-19. Nós não trabalhamos com a ideia de caridade e filantropia, mas de reforço e apoio comunitário – um apoio crítico, questionando por que as pessoas precisam de caridade. Neste mais de ano de pandemia, atendemos todas as famílias de nossa escola de forma digna e decente como também mais de 60 famílias com cestas básicas e kits de limpeza e higiene. Ajudamos nas inscrições do auxílio emergencial e educação financeira já prevendo a suspensão do auxílio. Agora estamos num dos piores momentos, o auxílio foi suspenso e é o momento em que contamos com menos doações. E o aumento de casos na pandemia nos obrigou a esperar mais para reabrir a escola. A gente agradece a oportunidade de poder trocar experiências com vocês e o apoio. É bom saber também que, nesta rede, nossas ideias, nossos fundamentos ‘batem’, se identificam.”
ZILDA CHAVES
Escola Quilombolista Dandara de Palmares
“Nós somos da Escola Quilombista Dandara dos Palmares, uma escola comunitária onde fazemos um trabalho com as crianças da comunidade. Com a pandemia, paramos em março de 2020 e nos voltamos a ajudar no socorro à comunidade. Nosso projeto é desenvolver as crianças e também cuidar das famílias numa educação que envolva a comunidade para que as crianças cresçam respeitando as suas origens, e nunca se envergonhando delas. A maioria é de crianças pretas, muito pobres. A volta aos trabalhos presenciais parece meio distante, mas a escola não está parada. Continuamos ajudando como o possível, cestas básicas. Temos a colaboração de voluntários, fizemos vaquinha na internet e, dessa maneira, vamos indo com o trabalho. Antes da pandemia, tínhamos projetos de música, arte, capoeira, reforço escolar. Todas as nossas crianças estão em escolas públicas – que estão fechadas. Por isso, estamos pensando como criar condições de reforço na leitura, na alfabetização – que foi, no fundo, um dos grandes motivos que nos levaram a criar a Escola Dandara dos Palmares: ajudar a desenvolver a leitura. Há crianças no quarto ano que não sabem ler! Se o problema já havia antes da pandemia, imagina agora com mais de um ano sem ir à escola.”
ANA PRISCILA ALVES – integrante da Marcha Mundial das Mulheres (MMM)
Projeto Comunidade Tavares Bastos
“Nós, da MMM, somos um movimento internacional de mulheres que atua com formação política, com população de rua, também temos nossa batucada. Todo dia 24 de abril é o nosso dia internacional de solidariedade entre as mulheres. São 24 horas de solidariedade feminista que marca o desabamento do prédio Rana Plaza, em Bangladesh, em 2013, que vitimou 1.134 pessoas (a maioria de mulheres tecelãs) e deixou cerca de 2.500 feridos. Cada país que compõe a Marcha Mundial das Mulheres faz essa ação. No ano passado, no contexto de pandemia, a gente começou a organizar ações de solidariedade nos territórios com doações, sejam das nossas companheiras agricultoras, sejam da economia solidária. Desde abril de 2020, então já há um ano, todo mês a gente organiza doações na comunidade da Tavares Bastos, no Catete. Neste ano, fomos criando laços, estreitando relações. Neste último mês, com a falta do auxílio emergencial, as companheiras de lá nos contactaram relatando que os alimentos têm chegado, mas com o agravamento da questão social, as pessoas têm a cesta básica mas não conseguem cozinhar porque não há dinheiro para comprar o gás. A gente sabe que a demanda das pessoas não é só alimento, gás, mas uma vida digna, uma vida que valha a pena ser vivida. Neste contexto, surgiu a ideia da construção de uma cozinha comunitária. E também a ideia de fazer hortas comunitárias. Tudo no sentido de que consigamos distribuir as refeições já prontas. É uma comunidade que tem 200 famílias. Surgiu esse desafio e estamos abraçando. Portanto, neste mês, vamos fazer uma campanha de solidariedade voltada para arrecadar recursos para comprar o gás mas já vamos desenhar o projeto da cozinha comunitária para fazê-la sair do papel o mais breve possível.”
ROBERTO GOMES DOS SANTOS – integrante da Central de Movimentos Populares e do Coletivo Mais Amor Menos Capital
Projeto Quilombo da Gamboa
“O Quilombo da Gamboa era um projeto de moradia com seis terrenos cedidos pela Superintendência de Patrimônio da União (SPU) e da Sedurb – um pouco antes do projeto de revitalização da Zona Portuária do Rio. Eu sou oriundo do movimento sem teto, ajudei a ocupar, por exemplo, a Zumbi dos Palmares. Morei durante 8 anos na ocupação Quilombo das Guerreiras. Logo em seguida passei para o Quilombo da Gamboa onde os seis terrenos foram cedidos para construir moradias para 116 famílias. Uma das questões junto à SPU e à Prefeitura do Rio é justamente que estes terrenos fossem na Zona Portuária – para resgatar as heranças africanas que ali estão e a história de negros e negras naquela região. Em 2015, fizemos a assinatura desses projetos com a Caixa Econômica Federal e, logo em seguida, o projeto saiu da relação dos que seriam realizados até 2020. Então o projeto está paralisado e temos 116 famílias inscritas – famílias oriundas do Complexo do Alemão, Rocinha, Complexo da Penha, Região Portuária, Pavuna, Benfica, enfim, famílias de vários bairros do Rio. Com a pandemia, muitas dessas famílias relataram que já não conseguiam pagar seus aluguéis e como havia os seis terrenos disponíveis, resolvemos construir, em parceria com a Teto, casas emergenciais de madeira. Hoje temos 17 famílias que moram no terreno mas estão chegando outras e vamos completar 20 famílias. As casas são espaços pequenos que mal cabem famílias de três, quatro pessoas – não podemos fazer algo grande porque ainda temos a perspectiva de reativar o projeto, arranjando parcerias para que, de fato, sejam feitas essas 116 moradias de interesse social na Zona Portuária do Rio de Janeiro. Também estamos fazendo uma cozinha comunitária, para evitar que as pessoas cozinhem em suas casas de madeira e também para produzirmos quentinhas para pessoas em situação de rua. Também estamos construindo um espaço multicultural para, no futuro pós-pandemia, realizarmos nossas reuniões. Este espaço será multiuso, vai servir para nossas próprias reuniões, para os moradores, para a biblioteca – já temos 2,5 mil livros.”
“Nós temos um grande projeto, cujo ponto inicial foi o Quilombo da Gamboa, que se chama ”Reafricanizando”. Ali na região da Marechal Floriano, Rua do Acre, Miguel Couto nós contamos 19 ocupações que costumamos chamar de “não-organizadas”, ou seja, ocupações espontâneas. Ao lado de uma dessas ocupações, o dono de um restaurante doou um espaço e o estamos transformando numa escolinha popular. Pensamos, no projeto “Reafricanizando”, tomar de volta aquilo que é nosso, que é da negritude, que é do povo preto”, completa Roberto.
ANA PAULA RIOS – engenheira de produção
Instituto Lar e “Da Rua para Você”
“Desde 2017, estamos desenvolvendo alguns projetos e produtos para melhorar a vida de pessoas em vulnerabilidade social, principalmente as pessoas em situação de rua. Tive uma atuação forte na pandemia com as ‘Pias do Bem’ que instalamos em parceria com o Sisejufe. Hoje estou como uma das diretoras do Instituto Lar que é uma ONG que existe desde 2017 com o principal objetivo de oferecer atividades e ferramentas para a reinserção social de pessoas em situação de rua. Antes da pandemia, o Instituto tinha atividades de segunda a sábado para esse público como atendimento psicológico, grupos terapêuticos, aulas de arte, palestras, rodas de empregabilidade e atendimento jurídico – que era oferecido pelo Sisejufe. Durante a pandemia, passamos a atuar de forma mais emergencial oferecendo quentinhas, lanches e cestas básicas – não só para a população de rua como também para famílias carentes do Rio de Janeiro e da Baixada Fluminense. Ao todo, já foram mais de 40 mil pessoas alcançadas, mais de 35 mil quentinhas distribuídas e mais de 83 toneladas de alimentos arrecadados e servidos pelo Instituto Lar.”
Ana Paulo disse ainda: “Eu também coordeno o “Da Rua pra Você” que é um negócio de impacto social e atua com capacitação de pessoas em situação de rua e vulnerabilidade social. Este ano, estamos com um formato diferente, estamos fazendo testes e em breve vamos fazer nossa primeira oficina virtual – com outro foco: uma oficina que será realizada para mulheres da comunidade de Brasilândia, em São Paulo. Daqui do Rio, vamos ensinar as mulheres de São Paulo a fazer as pias e monitorar o trabalho. Eu sou muito grata pela parceria com o Sisejufe, com o qual já realizamos alguns projetos. Fico muito feliz de poder continuar e neste ano temos um projeto de Vila Ecológica Inteligente, voltada para mulheres em situação de rua em que o principal objetivo é criar um ambiente favorável para reinserção dessa população mas que seja um ambiente cercado de tecnologia, de inovação que vai ampliar as chances dessa mulher realmente voltar pra sociedade em melhores condições.”
ANA SANTOS
Centro de Integração na Serra da Misericórdia – CEM
“Sou mulher preta, feminista, do quintal, das cozinhas, das cozinhas das trincheiras de luta, moradora de favela e uma das idealizadoras e fundadoras do CEM – Centro de Integração na Serra da Misericórdia. Estou aqui falando do Complexo de Favelas Penha nessa última área verde, nesse suspiro de Mata Atlântica no meio da favela. Se tem dúvida se a favela é cidade, eu coloco se na favela tem meio ambiente. E é por essa área verde que nosso trabalho cresce e vai se desenvolvendo aqui no território pensando autogestão, agroecologia, agricultura urbana – que são fatores fundamentais no processo de desenvolvimento comunitário. A gente atua sobre os eixos da Educação, da Cidadania e da Comunicação. E pensando sempre na promoção da soberania alimentar. E chegou a hora de a gente mudar as regras do jogo num ano e num mês assolados pela pandemia. E nas favelas, nas periferias, a gente sabe que a fragilidade é muito maior. Mas a agroecologia vem nos ensinando e nos fortalecendo.”
“O nosso trabalho conduz à relação das feiras solidárias e agroecológicas – não fazemos em formato de cestas, mas de feira, para que a moradora consiga escolher o que ela quer e a quantidade. E há também muitas trocas e um trabalho de educação alimentar. E para fortalecer a soberania alimentar o papel da educação alimentar e da troca é essencial. Nosso trabalho é muito baseado na família, mas esta família é liderada, em 61% dos casos, por mulheres. Acho muito bacana quando se fala aqui das cozinhas, porque a cozinha é uma ação que o CEM vem desenvolvendo há muito tempo – com diversas receitas, uso dos alimentos de outras formas. Por outro lado, a água também é fundamental. Acabamos de produzir uma cisterna de 75 mil litros por financiamento coletivo. O trabalho nos quintais com plantio, farmácia. Então esses trabalhos a gente vem conseguindo desenvolver, mas o trabalho de Educação, com as crianças, tem sido uma grande fragilidade. Por isso, é muito bom ouvir aqui da Escola Quilombola, vocês estão muito perto da gente. É importante fazer essas trocas. Esse movimento de troca, que está acontecendo aqui nesta rede, é muito importante”, informou ainda Ana Santos.
TUANNY DANTAS
Pré-vestibular Bosque das Caboclas
“É um orgulho estar aqui com projetos tão grandes e tão consistentes. A gente do Pré-Vestibular Popular está no quarto ano. A gente fica em Campo Grande, na Estrada dos Caboclos, no início da Reserva da Pedra Branca. Então nossa relação com o território perpassa estar em frente ao maior parque estadual do Rio de Janeiro. Estamos numa comunidade que é fruto de uma ocupação e conseguimos a troca do nome para Bosque das Caboclas, para demarcar a presença feminina e nós somos um dos braços da associação de moradores do local – que tem também juventude ecológica, coletivo feminino, tem horta comunitária, tem uma cozinha aberta – que, na verdade, estava aberta ao uso de todos mas a pandemia nos desmontou. Primeiro perdemos a líder da horta comunitária, por covid-19. A antiga presidente da associação, que tem uma história muito bonita de militância, teve de se afastar. E nós, do pré-vestibular, precisamos ir pro remoto. E fomos pro trabalho remoto sem estrutura, sem planejamento prévio, com uma comunidade que, na maioria, não tem acesso à internet – até o meio de 2020, nenhuma banda larga entrava na região, além do sinal de muitas operadoras de telefonia ser muito ruim”.
Tuanny acrescentou: “Fomos até o final de 2020 com aulas coletivas e acabamos optando por usar Facebook e Whatsapp por não serem descontados nos pacotes de dados e franquias de 3G – apesar de não serem ferramentas muito úteis para a natureza do projeto. O nosso viés é educação popular. A gente acredita em uma educação que pensa o território, o local, que pensa quem é o aluno e a aluna e que é construída coletivamente. E a gente funciona apenas com as doações que a gente consegue através de eventos como, por exemplo, festa junina, saraus. Assim funcionava o projeto pré-pandemia. As aulas aconteciam aos sábados porque boa parte dos nossos educandos trabalhavam distantes da região e temos um grande problema de mobilidade porque só há um ônibus que dá acesso à comunidade. Então, funcionávamos aos sábados, das 8h às 19h, oferecendo almoço e lanche. Então, dentro da nossa arrecadação feita de eventos, rifas e doações, conseguíamos os valores para alimentação, questões estruturais e, eventualmente, ajudas de custo para alguns professores. Passamos por momentos de muita dificuldade, especialmente no final do ano passado. Estamos tentando, neste ano, remodelar as aulas on-line e tentar reativar nossa relação com o território que ficou muito distante no ano passado até mesmo porque nem todos os professores são da região. Tínhamos professores de toda a Zona Oeste. A pandemia nos desestruturou e também a própria associação de moradores. Estamos, portanto, tentando nos repensar, nos recriar e é muito bom estar numa rede de projetos que existem há mais tempo porque precisamos estratégias para nos reconectar.”
*Henry Figueiredo é jornalista / especial para o Sisejufe
SAIBA MAIS
Relembre, nesta reportagem, o conjunto de ações que o Sisejufe prepara dentro da Agenda 2030
https://sisejufe.org.br/noticias/sindicato-prepara-acoes-concretas-para-2021-2022/
Conheça aqui quem são as(os) diretoras(es) do Sisejufe que integram o Departamento de Gestão Social
https://sisejufe.org.br/diretoria/conheca-a-diretoria-2020/