Ao instituir o isolamento social contra o avanço da covid-19, a Organização Mundial de Saúde- (OMS) jamais poderia supor que a medida viesse a favorecer a violência doméstica. Ficar em casa nesse momento de pandemia deveria ser o lugar mais seguro para qualquer pessoa. Mas para muitas mulheres brasileiras têm sido motivo de angústia, medo e dor.
No isolamento as mulheres estão mais suscetíveis a sofrer alguma forma de agressão, seja física, sexual, moral ou psicológica. De acordo com o Ministério Público de São Paulo nesse período houve um aumento de 30% no estado e 50% no Rio de Janeiro. Ainda de acordo com o MP/SP registros de violência são feitos com maior incidência no final de semana. A justificativa é a maior permanência que a mulher fica ao lado do agressor, somados ao uso de bebidas alcoólicas ou entorpecentes.
A ONU Mulheres, entidade da Organização das Nações Unidas pela igualdade de gênero e empoderamento, divulgou em abril o relatório “A sombra da pandemia: violência contra mulheres e meninas e Covid-19”. O documento aponta que o aumento da violência contra a mulher é mundial. Em países como Argentina, Canadá, França, Alemanha, Espanha, Reino Unido e nos Estados Unidos, autoridades governamentais e ativistas dos direitos das mulheres denunciaram o crescente aumento de violência doméstica e nos pedidos de abrigos de emergência.
No Brasil não é diferente. O país ocupa o 5º lugar no ranking nesse tipo de violência. Em alguns estados esse aumento superou os 50%. Um levantamento realizado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) mostrou que o número de ocorrências aumentou em ao menos sete estados. Os registros em São Paulo, Acre, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Mato Grosso e Pará aumentaram consideravelmente em comparação ao mesmo período do ano passado. Outros estados também registraram aumento. As agressões vão desde física e moral ao feminicídio.
O confinamento tem trazido tensão, insegurança, preocupações com saúde e em muitos casos com a falta de dinheiro. Somado a tudo isso, estão os filhos que também são afetados e que sofrem com a ausência da escola, dos amigos, do parque de diversões. O ambiente familiar perdeu a harmonia em vários endereços. É verdade que isso nada justifica violência contra a mulher, mas o estresse provocado pela pandemia tem contribuído e muito com esse aumento.
A violência doméstica é uma das maiores violações dos direitos humanos. As leis de proteção são precárias e quase inexistentes. Um a cada quatro países não tem leis específicas de violência doméstica. No Brasil, a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006) representou um grande avanço e deu coragem para as mulheres fazerem denúncia. Mas nunca coibiu as agressões. Hoje, quatorze anos depois de sua criação, mulheres continuam sendo agredidas, violentadas e mortas todos os dias. As circunstâncias atuais impostas pela pandemia de Covid-19 trouxe também subnotificação de casos. Os números levantados podem ser ainda maiores. Limitações no acesso a telefones, rede social e restrições ao convívio familiar e social, impedem a denúncia. O isolamento as tem colocado à mercê de seu agressor. É preciso urgência para combater esse comportamento violento a portas fechadas.
Diante dessa aceleração desenfreada da violência, entidades e ONGs (Organizações Não Governamentais) de proteção e apoio às mulheres criaram mecanismos e novos canais de denúncias. A situação levou o secretário geral da Organização das Nações Unidas (ONU) a apelar aos governos dos países a fazer da prevenção e reparação da violência contra as mulheres, uma parte essencial de seus planos nacionais contra a Covid-19. Os abrigos e linhas de ajuda para as mulheres devem ser considerados um serviço essencial em todos os países.
Depois de receber muitas notificações dos tribunais o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) criou um grupo de trabalho para elaborar sugestões de medidas emergenciais para prevenir ou frear a violência doméstica nesse período de pandemia. O GT deve sugerir medidas que garantam celeridade, efetividade e prioridade no atendimento às vítimas de violência no PJU.
A Câmara dos Deputados aprovou no dia 21 de maio, projeto de lei (PL) que assegura medidas de combate à prevenção à violência doméstica durante a pandemia. O PL prevê a criação de serviço online que solicite o pedido de ajuda e a solicitação de medida protetiva. O texto encaminhado ao Senado estabelece ainda que as denúncias feitas pelo Canal de Atendimento à Mulher em Situação de Violência (Canal 180) devem ser repassadas em até 48 horas, para os órgãos competentes.
Diante disso, inúmeras campanhas e redes de apoio foram criadas pra defender a vidas dessas mulheres. Muitas dessas redes são iniciativas das próprias mulheres que se uniram em defesa umas das outras. As campanhas ainda alertam para a situação de meninas e adolescentes que com o isolamento social podem estar sendo vítimas de abusos e maus tratos dentro de casa.
A Covid-19 obriga o mundo a passar por choques culturais, emocionais, econômicos e o medo da perda de vidas. As pessoas tem medo da morte. A violência contra a mulher tão aumentada e em evidência nesse momento tem a característica sombria dessa pandemia. A sensação que temos é que se o mundo não se unir contra tudo isso, o mundo vira devastação. O enfrentamento à violência contra a mulher não pode ter sexo. É urgente.
Em caso de violência, se ligue:
– 190 e denuncie.
– 180 e faça sua denúncia
Conheça ainda:
#QuarentenaSimViolênciaNão – organizações públicas e da sociedade civil atuando na frente do combate à violência.
#MeteaColhrer – Startup utiliza da tecnologia como aliada no combate à violência contra as mulheres.
#SOSMULHER – Aplicativo desenvolvido pela polícia civil se São Paulo, para garantir a segurança de mulheres que estejam sob medida protetiva agora foi ampliado para atender qualquer uma que sofra agressão no isolamento.
#ISAbot – Rede criada para segurança de mulheres lançado no final de 2019, no Messenger e Google Assistente.
Procure ainda a Polícia Civil – Delegacia da Mulher de seu estado. A maioria dispõe de Boletim de Ocorrência eletrônico, pelo site da instituição.
Joana Darc Melo, da Fenajufe
Fonte: Imprensa Fenajufe