Por João Victor F. do N. de Albuquerque*
Na semana passada, fomos surpreendidos com a maior ameaça à Justiça do Trabalho desde a sua instalação, nos anos de 1941. Ao lermos a notícia de que o deputado federal Paulo Eduardo Martins (PSC/PR) apresentou uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) com o mote de unificar a Justiça do Trabalho à Justiça Federal e o Ministério Público do Trabalho ao Ministério Público Federal, foi inevitável nos recordarmos da frase cunhada pelo presidente do TRT/RJ, desembargador José da Fonseca Martins, no sentido de que “A Justiça do Trabalho brasileira sobreviveu aos períodos de chumbo e pode ser extinta na democracia”.
Contrapondo-se ao prognóstico acima, é possível perceber que alguns servidores têm se mostrado céticos quanto a essa possibilidade, baseando-se em argumentos, que servem como uma espécie de “premissas reconfortantes”, muitas vezes dissociadas do atual contexto político, e que, por essa razão, devem receber a nossa atenção.
A. A PEC é inconstitucional porque não foi proposta pelo STF.
Alguns servidores vêm se tranquilizando com a tese de que a Justiça do Trabalho não pode ser extinta por uma PEC de iniciativa do Legislativo ou do Executivo, pois somente o Supremo Tribunal Federal poderia propor a extinção da Justiça do Trabalho ou a sua unificação à Justiça Federal, como deseja o eufemismo daqueles que querem nos destruir. Os defensores dessa tese se esquecem de que a EC nº 45/2004, que tratou da reforma do Poder Judiciário como um todo, incluindo a Justiça do Trabalho, não foi proposta pelo STF.
Além disso, é importante ressaltar que o art. 60, caput, da Constituição de 1988, que define quem tem a competência para propor uma Emenda Constitucional, não conferiu essa prerrogativa a qualquer órgão do Poder Judiciário, incluindo o STF. Desse modo, o Constituinte Originário apenas reservou essa competência aos Tribunais, em se tratando de Projeto de Lei Ordinária, nos termos do art. 96 da Constituição, e não em relação a Propostas de Emenda Constitucional.
B. Os servidores da Justiça do Trabalho serão absorvidos imediatamente pela Justiça Federal. Não haverá prejuízos!
Uma outra falsa premissa que satisfaz aqueles que não querem enxergar a dimensão do problema é a de que os servidores da Justiça do Trabalho seriam absorvidos imediatamente pela Justiça Federal, não havendo qualquer prejuízo àqueles que carregam o piano da Judiciário Trabalhista. Ocorre que essa afirmação não condiz com o texto da PEC que foi apresentado pelo deputado federal proponente.
Se pararmos para analisar o texto da PEC, descobriremos que o art. 6º, § 2º, da PEC dispõe que: “Os servidores das Varas do Trabalho serão redistribuídos à Justiça Federal, dentro da respectiva região, conforme a necessidade de serviço”. (o grifo é nosso)
Dessa forma, a partir da PEC, não há garantias de que nós, enquanto servidores da Justiça do Trabalho, seremos absorvidos imediatamente pela Justiça Federal, que possui uma estrutura física e orçamentária infinitamente menor em comparação ao Judiciário Trabalhista. Assim, o trecho destacado condiciona a redistribuição dos servidores das Varas do Trabalho a critérios de conveniência e oportunidade, a serem verificados junto à realidade da Justiça Federal, devendo ser considerada, ainda, a absorção dos servidores do TST e daqueles lotados nos TRTs, já que a PEC também prevê a aposentadoria compulsória e integral dos Ministros do TST e dos desembargadores dos TRTs, sem prever qualquer aumento no quantitativo de ministros do STJ e de desembargadores federais junto aos TRFs, para abarcar a matéria trabalhista.
É possível concluir que, até que houvesse o aproveitamento de servidores a que alude a PEC, com base no atual art. 41, § 3º, da CRFB/1988, os servidores estáveis seriam colocados em disponibilidade com remuneração proporcional ao tempo de serviço; já os servidores não estáveis, infelizmente, estariam sujeitos à exoneração por desnecessidade do cargo.
c. A Sociedade Civil e o Congresso Nacional não permitirão a extinção da Justiça do Trabalho
Os defensores da ideia de que as entidades da sociedade civil e o Congresso Nacional não permitiriam a extinção do Judiciário Trabalhista se esquecem de que esse mesmo Congresso Nacional aprovou a Emenda Constitucional nº 95/2016 e a Reforma Trabalhista, apesar de, em ambos os casos, ter havido demonstração de descontentamento por parte de magistrados e procuradores do Trabalho, de entidades da sociedade civil e de sindicatos representativos dos trabalhadores, a partir de ações de conscientização e de movimentos paredistas. Nada disso foi suficiente para barrar o ataque contra a classe trabalhadora, da qual fazemos parte.
Além disso, a premissa cai por terra a partir da própria fala do presidente Jair Bolsonaro, logo no início de seu governo, no sentido de que a extinção da Justiça do Trabalho e do MPT poderão se concretizar, se houver clima no Congresso Nacional para tanto.
Dessa maneira, cabe à nossa categoria não permitir que esse clima seja criado. É preciso defender a instituição Justiça do Trabalho e, em última análise, é necessário que sejamos protagonistas do nosso próprio destino, a fim de glorificar todo o nosso esforço profissional e de vida, desde o momento em que resolvemos prestar concurso para esse ramo do Judiciário, que vem sendo atacado por alguns dos nossos representantes, os quais ocupam cargos atualmente no Legislativo e no Executivo.
É imperioso que haja muita mobilização nas ruas e nas redes sociais para vencermos a retórica desonesta do deputado federal Paulo Eduardo Martins, que incluiu na exposição de motivos da PEC a justificativa de que a Justiça do Trabalho é menos eficiente, se comparada à Justiça Federal, contrariando os estudos do próprio CNJ, que atestam o grau de maior eficiência do Judiciário Trabalhista.
Para vencer essa e as demais mentiras que vêm sendo espalhadas sobre a Justiça do Trabalho, é necessário acordar definitivamente do sonho de que somos imunes a qualquer ataque e de que alguém irá nos proteger dessas ameaças, que podem vir a se concretizar no atual contexto político-ideológico.
Vamos à luta defender a nossa instituição, trabalhadores e trabalhadoras da Justiça do Trabalho!
João Victor F. do N. de Albuquerque é analista judiciário e representante de base do Sisejufe no TRT/RJ