Crítica foi feita por especialistas e entidades que defendem o setor durante debate em comissão especial na Câmara
A retirada de direitos das pessoas com deficiência que a Reforma da Previdência do governo Bolsonaro promoverá, se for aprovada, resultará no aumento da miséria para este segmento da população brasileira. A PEC 6, que trata das alterações nas regras da aposentadoria, não permitirá mais, entre outros pontos, a acumulação da pensão por morte no caso dos pais de filhos deficientes, além de reduzir o valor do benefício. Também tornará mais rígido o acesso à aposentadoria para as pessoas com deficiência, principalmente para as mulheres.
Severas críticas às mudanças foram feitas durante audiência pública na Comissão Especial das Pessoas com Deficiência da Câmara que ocorreu em 23 de abril, em Brasília. A reunião foi acompanhada pela diretora do Sisejufe, Soraia Marca. Especialistas em direito previdenciário e representantes de entidades que defendem o setor participaram do debateu com o tema “Os impactos da Reforma da Previdência nos direitos das pessoas com deficiência”. Os especialistas foram enfáticos ao afirmar que a proposta do governo Bolsonaro retira direitos das pessoas com deficiência. A diretora do Sisejufe Soraia Marca acompanhou os debates na audiência pública na comissão especial.
Com a PEC 6 – o relatório de admissibilidade foi aprovado no mesmo dia em que ocorreu a audiência pública pela Comissão de Constituição e Justiça(CCJ) da Câmara – aumenta de 24 anos para 25 anos o tempo de contribuição paras as mulheres, em caso de deficiência moderada, e de 28 anos para 35 anos para quem tiver deficiência leve.
A mudança prejudicial na concessão de Benefício de Prestação Continuada (BPC), que é destinado à população idosa de baixa renda, também foi denunciada pelos participantes do debate. Conforme a PEC, o governo quer incluir entre as condições de acesso que o segurado não tenha patrimônio familiar de até R$ 98 mil e impedirá também que o benefício seja acumulado com outros benefícios assistenciais, como o Bolsa-Família. A reforma determina ainda a diminuição do valor do auxílio-inclusão de 50% para 10% do salário mínimo. O pagamento deste benefício serve para incentivar que as pessoas com deficiência tenham chances de entrar no mercado de trabalho.
PROPOSTA ATINGE OS MAIS VULNERÁVEIS
Um das autoras do requerimento para promover a audiência pública na comissão, a deputada Erika Kokay (PT-DF) ressaltou que a Reforma da Previdência do governo Bolsonaro atinge diretamente um segmento vulnerável da sociedade que precisa ser protegido. De acordo com o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 22% da população brasileira apresentam algum tipo de deficiência.
“A Reforma da Previdência penaliza principalmente os mais pobres. É uma crueldade, por exemplo, querer economizar R$ 190 bilhões do BPC, de idosos ou retirar do deficiente o direito de acumular a pensão dos pais já falecidos, uma vez que estes contribuíram para a Previdência. Isso é uma tentativa de apropriação indébita”, acusou.
Na avaliação da subprocuradora-geral do Trabalho e vice-presidente da Associação Nacional de Membros do Ministério Público de Defesa dos Direitos dos Idosos e Pessoas com Deficiência (AMPID), Maria Aparecida Gurgel, o Brasil corre o risco de ser responsabilizado e responder internacionalmente pelo agravamento da pobreza de pessoas com deficiência, caso não haja alterações na proposta da equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes. Ela ressaltou que a PEC 6 viola a Constituição e afronta convenções internacionais assinadas pelo país que defendem os direitos das pessoas com deficiência. Entre os vários documentos, a subprocuradora-geral citou a Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência, adotada pela Assembleia Geral da ONU em 13 de dezembro de 2006, e promulgada pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva em agosto de 2009.
“O lucro precisa andar junto com o progresso. Se tomarmos uma decisão que nos coloca em choque com as organizações internacionais, com acordos assinados por nós, teremos que responder internacionalmente por outras questões”, alertou a subprocuradora.
RETROCESSO NOS DIREITOS CONQUISTADOS
Maria Aparecida Gurgel reivindicou que deputados retirem a Assistência Social da Reforma da Previdência. “A Assistência Social é direito inabalável, de acordo com a nossa Constituição, e não tem a ver com contribuição. Dessa forma, não podemos pensar o direito assistencial da mesma forma que pensamos a aposentadoria”, avaliou. “A Constituição proíbe o retrocesso social, e a Previdência é um desses direitos. O Brasil não pode voltar atrás em 30, 40 ou 50 anos em direitos conquistados. O país assinou tratados e convenções, já incorporados à nossa Constituição, que garantem proteção às pessoas com deficiência”, completou.
Representante da Rede Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, Ana Claudia Figueiredo afirmou que “é obrigação da sociedade tratar de forma diferenciada as pessoas com deficiência”. “E isso não é privilégio ou benesse, são direitos reconhecidos a este segmento da população por normas constitucionais”, lembrou.
Ela lembrou a questão da pensão por morte estabelecida de forma geral pela PEC 6. Segundo Ana Claudia, o custo com uma pessoa deficiente é maior do que em relação aos demais, o que preocupa o fato da proposta oferecer 50% do rendimento somados a 10% por dependentes. “O texto não pensou no caso dessa família contar com uma pessoa com deficiência”, afirmou.
Para Marco Aurélio Jr., diretor científico do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário, a proposta de aposentadoria do texto da PEC 6 tem exigência que destoa da realidade brasileira, uma vez que inclusão da pessoa com deficiência no mercado de trabalho é mais dificultosa e tardia.
A deputada federal Rejane Dias (PT-PI) questionou que o Estado não pode retirar direitos que asseguram uma melhor qualidade de vida a estas pessoas. A parlamentar tem uma filha autista, que necessita de atenção especial.
“O Estado não pode retroceder em retirar direitos. Nos casos de autismo, muitas mães não têm sequer condições de trabalhar, portanto dificultar o acesso ao BPC é uma crueldade”, afirmou.
O coordenador do Departamento de Acessibilidade e Inclusão do Sisejufe, Ricardo Azevedo, ressalta que é preciso resistir. “Temos que derrotar esta malfadada reforma previdenciária que prefiro chamar de deforma previdenciária, que só visa a destruição da sociedade brasileira como um todo. Este maldito projeto de Emenda Constitucional do senhor banqueiro Paulo Guedes visa retirar recursos exatamente de quem mais precisa na população brasileira, qual seja, o segmento das pessoas com deficiência e idosos, além de todas as demais destruições previstas no texto do banqueiro. Tal intenção da PEC chega ser cruel, eu diria. Precisamos lutar e nos mobilizar ao máximo para derrotar tal intenção deste governo a serviço do grande capital financeiro internacional”, destaca Ricardo.